Chamada para Dossiê - Perspectivas críticas de abordagem da Publicidade - A embalagem do Sistema 40 anos depois

2025-05-12

Publicado há quarenta anos, o livro A embalagem do Sistema, de Maria Arminda do Nascimento Arruda (1985), foi precursor ao oferecer uma chave analítica de extração crítica para refletir sobre a publicidade no contexto social brasileiro, em uma perspectiva sociológica. Nesse mesmo período, a publicidade brasileira se consolidou enquanto campo relativamente autônomo de atividade, ao passo que o conhecimento científico sobre ela adquiriu envergadura, espaços de discussão e legitimidade epistemológica, configurando um lugar próprio de problematizações sobre os processos de produção, circulação, recepção e consumos, em chave macro e microestrutural. Ao reconhecer a publicidade como elo entre o capitalismo monopolista e a Indústria Cultural, Maria Arminda abre as portas para um estudo mais amplo deste fenômeno no Brasil. 

Sua análise foi continuada na obra Mercado Brasileiro de Televisão, de César Bolaño (1988), que parte, por sua vez, da Indústria Cultural em geral, a partir da qual são particularizadas as funções que esta cumpre no capitalismo, entre elas a publicidade. A partir deste trabalho, a Economia Política da Comunicação se apresenta como o subcampo em que a publicidade é analisada em um sentido mais totalizante. As origens desses dois campos de estudo têm em comum, ainda, a influência do trabalho da chamada Escola da Unicamp, com destaque para o trabalho de João Manuel Cardoso de Mello sobre o capitalismo tardio. Importante destacar que a obra de Arminda, assim como a de Bolaño, não retiram sua abordagem dialética de uma mera aplicação dos modelos propostos por Marx ou pelos clássicos da escola de Frankfurt. A perspectiva crítica adotada tem origem, sobretudo, numa observação detida do próprio objeto em sua configuração nacional, em diálogo direto com os autores que anteriormente produziram argumentos sobre a questão. Observando, por exemplo, o trabalho de Maria da Conceição Tavares, ambos destacam as condições salariais da classe trabalhadora brasileira, a fim de analisar as particularidades da publicidade e da Indústria Cultural no contexto nacional. Deste modo, é possível identificar que a dialética como método de análise e exposição surge não de uma aplicação exterior, mas de uma avaliação da configuração nacional de seu objeto, o que continua valendo como premissa de abordagem.

 Nas duas últimas décadas, aportes teóricos diversos, originados desde o próprio campo científico da publicidade e para além dele, têm contribuído na abordagem das especificidades e transformações do fenômeno publicitário em chave crítica. Por exemplo, a obra de Maria Eduarda da Mota Rocha (2010) dedicada a estudar a nova retórica do capital avança as proposições originais de Maria Arminda para o período histórico em que o neoliberalismo se apresenta como o modelo de regulação dominante. Por outro lado, a EPC seguiu desdobrando os aspectos mais gerais, por exemplo ao apontar a publicidade como dinâmica organizadora fundamental das plataformas digitais, embora sejam escassos os trabalhos que se debruçam especificamente sobre a publicidade, a partir de tal perspectiva.

O que se extrai do exposto é que há diversas conexões entre as vertentes que derivam do trabalho de Maria Arminda, as quais este dossiê objetiva pôr em diálogo. Para além dessas perspectivas, o Dossiê propõe um espaço de reflexão sobre os estudos críticos acerca da publicidade na atualidade. Tomando a publicação de A embalagem do Sistema como um marco, estimula pesquisadores e pesquisadoras a apresentarem abordagens teóricas, observações empíricas, discussões epistemológicas que tematizam vertentes críticas de estudos sobre a Publicidade no Brasil. 

Com a publicação do dossiê, pretendemos contribuir para aprofundar o debate sobre as intrincadas vinculações entre o sistema publicitário com questões candentes no meio social, como a reestruturação produtiva, a plataformização, a proteção de dados, a ascensão da extrema-direita, o combate (ou endosso) das discriminações de gêneros, raça, classe, geração e outros marcadores sociais; a exploração da temática da diversidade, entre outros temas que evidenciam a relação entre a publicidade e as formações sociais contemporâneas. Também são bem-vindas reflexões que oportunizem reflexões sobre a obra de Arruda (1985) e de outros clássicos cujo resgate pode amparar o entendimento da Publicidade no contexto atual. O dossiê será coordenado pelas professoras Glícia Maria Pontes Bezerra (UFC) e Laura Wottrich (UFSM/UFRGS). Textos devem ser apresentados até 31  de julho de 2025.

São eixos temáticos indicados para publicação no dossiê:

  • Perspectivas históricas de abordagem crítica da Publicidade;
  • Perspectivas teóricas latino-americanas de crítica à publicidade;
  • Perspectivas teóricas brasileiras de crítica à publicidade;
  • Transformações econômicas no setor publicitário;
  • Transformações no capitalismo e na publicidade;
  • Publicidade e suas relações com a plataformização e a inteligência artificial;
  • Publicidade e suas relações com os regimes democráticos;
  • Publicidade e suas relações com as dimensões sociais da experiência (gênero, raça, classe, geração, geolocalização, etc)
  • Perspectivas empíricas críticas sobre as práticas de produção, circulação, consumos, usos e recepção da publicidade.

Referências

ARRUDA, Maria Arminda do Nascimento. A Embalagem do Sistema– A Publicidade no Capitalismo Brasileiro. São Paulo: Duas Cidades, 1985.

BOLAÑO, César. Mercado Brasileiro de Televisão. 2 ed. rev. e amp. São Cristóvão, Sergipe: EDUFS-SE; São Paulo: EDUC-SP, 2004 [1988].

ROCHA, Maria Eduarda da Mota. A Nova Retórica do Capital:A Publicidade Brasileira em Tempos Neoliberais. São Paulo: Edusp, 2010.