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Revista TOMO, São Cristóvão, v. 42, e17897, 2023
DOI: 10.21669/tomo.v42i

Data de Publicação: 10/01/2023
Dossiê: Teorias Críticas Decoloniais

As contribuições do pensamento haitiano para o giro decolonial:
Barão de Vastey, Anténor Firmin, Louis-Joseph Janvier e

Hannibal Price

Bruna Ribeiro Troitinho1

Resumo:
O giro decolonial é um projeto inacabado de ordem global que analisa outras formas de saber, poder e ser.
Neste artigo, apresentamos as contribuições teóricas dos intelectuais haitianos Barão de Vastey, Anténor
Firmin, Louis-Joseph Janvier e Hannibal Price para o giro decolonial. As contribuições desses autores não se
limitaram a denunciar a falseabilidade do conceito de “raças” humanas do século XIX, como também pensa-
ram uma nova concepção de ser humano que englobava os povos escravizados. Analisando as contribuições
desses autores, percebemos algumas pistas que nos permitem pensar que suas obras são precursoras nas
teorias críticas à colonização.
Palavras-chave: Pensamento haitiano. Giro decolonial. Intelectuais haitianos. Anténor Firmin. Humanismo
Atlântico Haitiano.

Introdução

Este artigo objetiva apresentar as contribuições de intelectuais haitianos do século XIX para o giro
decolonial. Apresentamos neste artigo o pensamento de Jean Louis Vastey (1781-1820), Anténor
Firmin (1850-1911), Louis-Joseph Janvier (1855-1911) e Hannibal Price (1875–1946), cujas obras apresentam críticas ao colonialismo francês, ao racismo científico do século XIX e reflexões sobre a autonomia e o reconhecimento do Haiti. O contexto sociopolítico do Haiti do século XIX foi contur-
bado devido à cobrança de indenização por parte da França da independência haitiana, assim como
os entraves das demais nações em reconhecer a soberania de um país fundado por negros. Com isso, podemos afirmar que a colonialidade do poder – padrão de poder mundial eurocentrado – produziu
um silenciamento da Revolução Haitiana e da produção intelectual dos haitianos. Como este artigo
é parte de uma pesquisa maior, não apresentaremos as trajetórias individualizadas de cada um dos
autores, mas, sim, as suas contribuições teóricas para o Humanismo Atlântico Haitiano. O texto foi organizado em três seções. Na primeira, apresentamos as definições sobre giro decolonial
e os conceitos-chave do pensamento: colonialidade do poder, saber e ser. Situamos nessa seção a Re-
volução Haitiana como um marco central das lutas de libertação dos povos escravizados, bem como

1 Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Centro de Ciências Sociais e Humanas (CCSH). Programa de Pós-Graduação
em Ciências Sociais. Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: brunari.troitinho@gmail.com. https://orcid.org/0000-
0002-8178-9319

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as discussões sobre os efeitos do colonialismo. Na segunda seção, definimos o conceito de Huma-
nismo Atlântico Haitiano a partir do pensamento da historiadora Marlene Daut (2017). Por último,
apresentamos as teses de cada um dos autores e suas análises sobre o colonialismo e seus efeitos.

1. Revolução Haitiana como sociogênese histórica do giro decolonial

Neste artigo, referimos como pensamento decolonial clássico o trabalho do sociólogo peruano
Aníbal Quijano (1988, 2005, 2010) e de uma rede de intelectuais (Castro-Gómez; Grosfoguel,
2007; Lander, 2005; Maldonado-Torres, 2007; Mignolo, 2000), que, em diálogo com o pensamento
de Quijano surgido na década de 1990, fundaram o grupo Modernidade/Colonialidade (MC), res-
ponsável por sistematizar críticas aos efeitos materiais e subjetivos da colonização. Durante o iní-cio dos anos 2000, o grupo definiu seus conceitos, debates teóricos e intervenções epistêmicas por
meio de eventos e publicações. Esse novo “Programa de Investigação” (Escobar, 2003) se estrutu-
rava a partir de: 1) ênfase na origem da modernidade na conquista da América em 1492 (Dussel,
1993); 2) o colonialismo como um pilar de desenvolvimento do sistema-mundo capitalista; e 3) a visão da exploração dos outros fora do centro europeu como uma dimensão da modernidade (Es-
cobar, 2003). Passadas mais de duas décadas, o pensamento decolonial rompeu fronteiras territo-
riais, disciplinares e de autoria, ampliando o programa de investigação para além do grupo Moder-
nidade/Colonialidade, o que neste artigo será denominado como perspectiva decolonial ampliada.

Durante o período de fundação do grupo Modernidade/Colonialidade, a região do Caribe ocupou um
lugar periférico tanto na produção teórica quanto na participação em eventos acadêmicos. Isso se
deve ao legado do eurocentrismo na produção do saber latino-americano, que pensa uma pequena
região como um todo hegemônico e desenvolve o conhecimento a partir de si. Segundo Maldona-
do-Torres (2006), os intelectuais latino-americanos herdaram essa forma de conceber o saber con-
tinentalista, resultando num latino-americano-centrismo que está tanto nas áreas tradicionais de
estudos latino-americanos como nas perspectivas críticas. Nessa perspectiva, pensar com e desde o
Caribe se apresenta como uma alternativa de superação desse latino-americano-centrismo.

Conforme aponta Maldonado-Torres (2020), a presença caribenha no grupo Modernidade/Colo-
nialidade aconteceu por meio das publicações e diálogos de Sylvia Wynter, Ramón Grosfoguel,
Agustín Lao-Montes e do próprio Nelson Maldonado-Torres. O marco do aprofundamento da pre-
sença caribenha no pensamento decolonial foi o evento “Mapping the Decolonial Turn”, em 2005,
na Universidade da California. Lá, foi cunhado o conceito “giro decolonial”, além de criado um es-
paço de diálogo entre teóricos/teóricas do grupo Modernidade/Colonialidade, feminismo negro e latino-americano e de intelectuais caribenhos (Maldonado-Torres, 2018). A definição de giro
decolonial feita pelo autor é um projeto que

busca colocar no centro do debate a questão da colonização como componente constitutivo da modernidade e a descolonização como um número indefinido de estratégias e formas
contestatórias que projetam uma mudança radical nas formas hegemônicas atuais de po-
der, ser e saber2 (Maldonado-Torres, 2008a, p. 66, tradução nossa).

2 No original: “busca poner en el centro del debate la cuestión de la colonización como componente constitutivo de la moder-nidad, y la descolonización como un sinnúmero indefinido de estrategias y formas contestatarias que plantean un cambio
radical en las formas hegemónicas actuales de poder, ser, y conocer”.

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As contribuições do pensamento haitiano para o giro decolonial

Para compreender o giro decolonial, é preciso apresentar os três conceitos basilares desse pro-
jeto: colonialidade do poder, do saber e do ser. O termo colonialidade do poder foi desenvolvido
por Quijano (2005) e refere-se à construção da modernidade a partir de um padrão de poder
no qual as ideias de raça e racismo são os princípios organizadores da acumulação de capital mundial. A colonialidade do saber alude à racionalidade técnica, científica e epistemológica, cujo
único modelo válido de produção do saber é universal, neutro, objetivo e oculta todas as demais
formas de produção do conhecimento (Lander, 2005). O termo colonialidade do ser “refere-se ao
processo pelo qual o senso comum e a tradição são marcados por dinâmicas de poder de carácter
preferencial: discriminam pessoas e tomam por alvo determinadas comunidades” (Maldonado--Torres, 2008, p. 96). Uma melhor definição da colonialidade do ser é a categorização de que cer-
tas pessoas não possuem características necessárias de humanidade, portanto não são seres em
sua completude. As pessoas que estão enquadradas nessa “zona de não-ser”, conforme apresenta Fanon (2008, p. 26), estão em “uma região extraordinariamente estéril e árida” na qual não po-dem afirmar-se enquanto sujeitas e as espacialidades ocupadas por elas são interpretadas como
zonas de ausência de soberania, pois seus ocupantes não podem se autogovernar. Aos presos nes-
sa “zona do não-ser”, Fanon apresenta o desejo do homem negro – dos povos colonizados – em
transformar-se num ser ao questionar “O que quer o homem negro?” e a resposta é “o negro quer
ser branco” (2008, p. 27).

Entendemos a Revolução Haitiana como uma sociogênese histórica do giro decolonial ao pensar-
mos como Aimé Césaire (1968). O Haiti foi o lugar em que a negritude se ergueu pela primeira vez
e também aqui, neste artigo, apontamos que a crítica ao colonialismo e à colonialidade – a própria base do pensamento decolonial - também se ergueu pela primeira vez nesse lugar. Com essa afir-mação, não queremos retirar o impacto intelectual de outras geografias, como África e Ásia, e seus
intelectuais na construção do giro decolonial. Porém, como aponta Maldonado-Torres (2020), o
Caribe – e neste caso, o Haiti – é central para o pensamento decolonial por sua produção analítica,
criativa e crítica da colonialidade, como também uma sociogênese histórica desse pensamento.

A Revolução Haitiana (1791-1804) é o primeiro marco dessa sociogênese histórica do giro decolo-nial, tanto pelo fato histórico – foi a primeira revolução de independência exitosa na América Latina – quanto pela produção intelectual haitiana de crítica ao colonialismo a partir dessa experiência re-
volucionária. Conforme aponta Quijano (2005, p. 122), foi uma “revolução nacional, social e racial”,
resultando numa “descolonização real e global do poder”. Essa revolução se transformou num marco
global de um processo de reivindicação do estatuto de sujeitos daqueles e daquelas capturados em África, a busca por libertar-se da “zona de não ser” (Fanon, 2008; Mbembe, 2014). Através dos olhos
dos colonizadores franceses, os escravizados na colônia de São Domingues não estavam na categoria
de humanos, e sim de coisas, logo qualquer brutalidade contra esse objeto era permitida. Essa bru-talidade era salvaguardada pela existência do Código Negro, promulgado em 1685, documento que legalizou e institucionalizou a escravidão nas colônias francesas. O filósofo francês Louis Sala-Molins define o Código Negro como o documento mais perverso dos tempos modernos ao colocar os es-
cravizados na condição de objeto sem uma perspectiva de emancipação. Conforme o autor, o código
decreta que o escravizado “seja reconhecido pelo que é (não pela lei, que o ignora, mas pelo mestre):
a saber, um animal, uma coisa e um escravo. Legalmente, ele não é nada porque a lei o considera ape-nas para despojá-lo, no processo de tal consideração, de toda presença significativa”3 (Sala-Molins,

3 No original: “[...] that he be recognized for what he is (not by the law, which ignores him, but by the master): namely, an
animal, a thing, and a slave. Legally he is nothing because the law accounts for him only to strip him in the process of such
consideration of all meaningful presence”.

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2006, p. 82, tradução nossa). Para Casimir (2020), esse código fora a pedra angular da colonização, o qual submergiu o negro à margem da história, legalizando sua ausência de existência jurídica.
Durante o período de curso da Revolução Haitiana, intelectuais e políticos europeus olhavam
para esse movimento como impensável, pois “questionava o próprio quadro referencial dentro do qual proponentes e oponentes haviam examinado temas como raça, colonialismo e escravidão nas
Américas” (Trouillot, 2016, p. 140). Para Michel Rolph-Trouillot, a revolução era impensável para
o Ocidente também pela forma que atuava, uma vez que a abolição da escravidão realizada por
Toussaint, em 1794, não estava na pauta das pretensões universalistas das Revoluções Francesa e Estadunidense (James, 2010). Dessa forma, Trouillot (2016, p. 150) afirma que a Revolução Haitiana, pela sua prática política, “colocou em questão a filosofia ocidental e o colonialismo”. A filósofa Susan Buck-Morss (2011, p. 141) apresenta a Revolução Haitiana como “a prova de fogo para os ideias do Iluminismo francês”, pois, enquanto os revolucionários franceses se enxergavam
como movimentos de libertação de todas as pessoas das amarras da escravidão feudal, eles fecha-
vam os olhos para a situação nas colônias francesas.

A relevância histórica da Revolução Haitiana não se limita no processo de libertação – organizado pelos ex-escravizados que contestaram habitar a “zona de não ser” –, mas também inclui a Consti-
tuição da Independência, em 1805:

foi um instrumento de notado valor jurídico internacional, uma vez que consagrou o princípio da
autodeterminação dos povos, da soberania e independência nacional (art. 1º), sancionou a aboli-
ção da escravatura de forma pioneira (art. 2º), aclamou os direitos de igualdade perante a lei entre
os haitianos (arts. 3ºe 4º), de propriedade (art. 6º), liberdade religiosa (art. 50) e de culto (art. 51)
(Silva; Perotto, 2018, p. 133).

Assim, compreendemos a Revolução Haitiana como marco inicial dos processos de reivindicação da expansão dos direitos humanos para os escravizados, isto é, o reconhecimento da humanidade
dos povos colonizados (Casimir, 2020; Grovogui, 2006; Maldonado-Torres, 2008b; Silva; Perotto,
2018). Durante o século XIX, o Haiti encontrou dificuldades para o reconhecimento de sua independência pelas potências aliadas à França, que exigia altas indenizações e resultou em dificuldades eco-
nômicas para o país se estabilizar (Silva; Perotto, 2018). Os intelectuais haitianos do século XIX produziram reflexões sobre os efeitos dessa relação colonial com a França e a busca dos haitianos pelo reconhecimento de sua capacidade intelectual, visto que o contexto da produção do saber na-
quele século era marcado pela consolidação das teorias racialistas da desigualdade4. Dessa forma,
não é somente a Revolução Haitiana que foi silenciada por uma colonialidade do poder, como os
intelectuais haitianos também o foram por uma colonialidade do saber.

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4 Por teorias racialistas da desigualdade, definimos como as produções do século XIX que afirmavam que a humanidade era
composta por raças hierarquicamente organizadas. Essas obras estiveram nas bases de fundações de disciplinas Sociais e Humanas e foram referências na execução de políticas racistas. Um exemplo dessas obras é “Ensaio sobre a Desigualdade das Raças Humanas”, de Arthur Gobineau (1855), que classificava três raças humanas: branca (superior), amarela e negra
(inferiores).

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As contribuições do pensamento haitiano para o giro decolonial

2. Definindo o Humanismo Atlântico Haitiano

O Atlântico Negro, desenvolvido por Paul Gilroy (2012), analisa a construção da modernidade por meio da relação triangular entre Europa, África e Américas, resultando no surgimento de culturas
híbridas e heterogêneas que transcendiam os Estados-nação. Ainda de acordo com o autor, estu-
dar o pensamento afro-diaspórico como parte central da história ocidental produz uma “pers-pectiva explicitamente transnacional e intercultural” (Gilroy, 2012, p. 57). Numa periodização da
política negra moderna, Gilroy coloca o Haiti e a Revolução Haitiana como marcos evidentes do
“desenvolvimento do pensamento político africano-americano e os movimentos de resistência”
(Gilroy, 2012, p. 61).

Neste artigo, abordaremos os intelectuais haitianos a partir da perspectiva de um Humanismo do
Atlântico Negro, o qual foi um esforço intelectual de ambos os lados do Atlântico cujo objetivo era
provar que os negros eram iguais aos brancos que os escravizavam e eram humanos (Daut, 2017). Esse movimento teórico-filosófico se iniciou no século XVIII e seu maior reconhecimento mundial se deu com o Movimento Negritude no século XX, definido por Frantz Fanon (2008, p. 46) como “esforços dos negros contemporâneos em provar ao mundo branco, custe o que custar, a existência
de uma civilização negra”.

No livro “Discurso sobre o colonialismo”, Aimé Césaire (2020, p. 23) argumenta que a colonização
“desumaniza até o homem mais civilizado”, isso porque a ação colonial violenta dos colonizadores
todos os dias para transformar o colonizado em animal para aliviar suas consciências também os
animaliza. Ainda segundo ele, “o Ocidente, ao mesmo tempo que gargareja todas essas palavras,
não foi mais capaz de assumir os requisitos de um verdadeiro humanismo, de poder viver o ver-
dadeiro humanismo – o humanismo na medida do mundo” (Césaire, 2020, p. 71). Esse verdadeiro humanismo, na perspectiva de Césaire, seria um humanismo que enxergasse os povos colonizados
do mundo como humanidade, que os retirasse da “zona de não ser”.

Ampliando a perspectiva do Humanismo do Atlântico Negro, a historiadora Marlene Daut desen-
volve o conceito de “Humanismo Atlântico Haitiano”, que seria uma “maneira antiga de pensar
sobre a erradicação dos problemas do racismo e da escravidão por meio e desde o Estado-nação do
Haiti, mas também em colaboração com as potências mundiais Europeias e Americanas”5 (Daut,
2016, p. 12, tradução nossa, grifos da autora). Marlene Daut propõe pensar a categoria “Humanis-
mo Atlântico Haitiano” para demarcar o papel precursor do Haiti nos movimentos dos negros em
ambos os lados do Atlântico pelo reconhecimento de sua humanidade. No livro 6 “Barão e Vastey
e as origens do Humanismo Atlântico Negro”7, a autora demonstra como a República Haitiana fora a primeira experiência de um estado democrático a desafiar o conceito de humanismo, que
era restrito aos brancos, proclamando uma igualdade universal ao incluir os sujeitos negros, con-forme abordado na seção anterior. Assim, a autora afirma: “[...] o Estado haitiano foi o primeiro
a proclamar que nenhum ser humano poderia jamais ser escravizado por, para, ou no Esta-
do
”8 (Daut, 2017, p. XXVII, tradução nossa, grifos nossos). Assim, para a autora, os descendentes
da diáspora africana assumiram, a partir do século XIX, a missão de provar que a sua cor não os

5 No original: “a long-standing way of thinking about eradicating the problems of racism and slavery through and from the
nation state of Haiti, but also in collaboration with European and American world powers”.

6 Neste artigo, usaremos as citações e nomes de obras em português para um maior acesso ao saber. Colocaremos em notas de rodapé o título e/ou a citação, resguardando a grafia original. No original: “Le système colonial dévoilé”. 7 Nome original: “Baron de Vastey and the Origins of Black Atlantic Humanism”.8 No original: “the Haitian state was the first to proclaim that no human beings could ever be enslaved by, for, or in the state”.

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tornava selvagens, destinados à escravidão. Dialogando diretamente com Paul Gilroy, Daut (2017) afirma que o Humanismo Atlântico Negro é o espaço privilegiado em que podemos reconhecer a
contribuição de vozes negras para o pensamento anticolonial e antirracista.

3. “Todos os homens são homens”: O Humanismo Atlântico Haitiano de Barão de
Vastey, Louis-Joseph Janvier, Anténor Firmin e Hannibal Price

O pensamento social haitiano desde o início teve um posicionamento crítico em relação às ideias racialistas do século XIX. Por causa do contexto histórico da Revolução Haitiana, que derrotou o exército napoleônico e fundou a primeira república negra nas Américas, os intelectuais pós-inde-
pendência atuaram na construção de um contradiscurso em relação aos paradigmas que inferiori-
zavam os descendentes de africanos.

Um dos primeiros intelectuais haitianos é Jean Louis Vastey (1781-1820), mais conhecido como
Barão de Vastey, quem participou diretamente da Revolução Haitiana e no pós-independência tra-
balhou como secretário do rei Henry Christopher I. Em 1814, ele publicou a obra “O sistema colo-
nial revelado”, que apresentava uma visão crítica do colonialismo no Haiti, com testemunhos orais de vários ex-escravizados com o intuito de afirmar a humanidade negada desses (Peria, 2017).
Conforme aponta Vastey: “O sistema colonial, é a dominação dos brancos, é o massacre da escra-vidão dos negros” (Peria, 2017, p. 122). O contexto de produção teórica de Vastey era justamente no período de anseio por uma reconquista dos ex-colonos franceses, que argumentavam a impos-
sibilidade de autogovernar-se dos haitianos a partir de uma visão racista.

Vastey (1814) tinha o objetivo de demonstrar aos europeus que não conheciam a realidade do
sistema colonial os horrores vividos nas colônias, assim como registrar para posterioridade os
crimes da colonização e resgatar as memórias de seus compatriotas. Segundo o autor, os histo-
riadores – a sua época – que escreveram sobre a colonização eram brancos, inclusive colonos, os
quais esforçaram-se por descrever o clima, a produção e a economia rural, porém pouco registra-
ram sobre as crueldades do colonialismo. Desde 1814, os escritores haitianos questionavam a ani-
malização dos escravizados nas colônias como aponta Vastey neste trecho: “[...] em documentos
públicos estavam todos na mesma linha escravos, cavalos, bois, mulas, porcos etc. tudo era um só,
o homem foi vendido indiscriminadamente com porcos” (Vastey, 1814, p. 67, tradução nossa)9.

Os fatos que estou prestes a relatar são da maior veracidade; eles são notórios, reuni-os de famílias ainda existentes, cujos familiares experimentaram os tormentos que vou tentar
descrever, e dos infelizes que sobreviveram a estas torturas; estas testemunhas são irre-
futáveis; elas mostraram-me, em apoio do seu testemunho, membros mutilados por ferro ou assados por fogo. Tenho-os de um número infinito de pessoas notáveis e digna de con-fiança; além disso, nomeio os colonos que cometeram estes crimes; desafio-os a negar-me
(Vastey, 1814, p. 40, tradução nossa)10.

9 No original: “dans les actes publics, l’on voyait sur la même ligne les esclaves, chevaux, bœufs, mulets, cochons, etc. tout ne
faisait qu’un; l’homme était vendu indifféremment avec les cochons”.

10 No original: “Les faits que je vais rapporter sont de la plus grande véracité ;ils sont notoires , je les ai récueillis des familles encore existantes, dont les parens ont éprouvés les supplices que je vais essayer de crayonner , et des infortunés qui ont
survécu à ces tortures ; ces témoins sont irrécusables ; ils m´ont montré, à l’appui de leurs témoignages, des membres mutilés par le fer ou grillé par le feu. Je les tiens d’une infinité de personnes notables et dignes de foi; d’ailleurs je cite nommément les colons auteurs de ces crimes ; je les défie de me démentir”.

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As contribuições do pensamento haitiano para o giro decolonial

Os testemunhos utilizados por Vastey enfatizaram a memória coletiva de uma história vinda de bai-xo – dos subalternizados – para melhor compreender o colonialismo e a escravidão (Daut, 2017). Analisando o texto de Vastey, Marlene Daut nos mostra como ele estabelece uma alternativa de co-
nhecer a história da escravidão pelas narrativas de escravizados para além dos documentos. Essas
narrativas, para a autora, são uma interpretação do passado falando em nome das massas mortas anônimas, o que posteriormente foi desenvolvido no texto de Benedict Anderson, “Comunidades
Imaginadas”. Ainda nessa perspectiva, as imagens de tortura, estupro, pessoas queimadas vivas
e várias outras formas de mortes violentas dos escravizados são apresentadas na obra de Vastey
como uma ressurreição daqueles e daquelas que morreram inquietos buscando a liberdade. Outra
inovação de Vastey é a forma de narrar os traumas da escravidão, apresentados como reações físicas do autor ao escutar os testemunhos, resultando na corporificação do horror (Daut, 2017).

Acordarei as cinzas das muitas vítimas que atiraram para a sepultura, e pedirei empres-tadas as suas vozes para revelar os seus crimes. Vou exumar os infelizes que enterraram
vivos. Irei interrogar os espíritos dos meus infelizes compatriotas que lançastes vivos em
fornos de fogo; aqueles que espetastes, assastes, empalastes, e mil outros vários tormentos
inventados pelo inferno! (Vastey, 1814, p. 35, tradução nossa)11.Numa interpretação religiosa do significado dos escravizados mortos no Haiti, Dayan (1995, p. 264 , tradução nossa) afirma que a
paisagem do Haiti está repleta não apenas dos espíritos dos mortos em busca de descanso
e reconhecimento, mas de outros espíritos corpóreos que se lembram dos terrores da es-
cravidão, da monstruosa e institucionalizada magia de transformar humanos em pedaços de matéria preciosa e sexualizada12.

Dessa forma, a obra de Vastey é um dos primeiros esforços dos intelectuais haitianos para compre-
ender os efeitos do colonialismo para a sociedade haitiana e criar alternativas ao pensamento que
defendia a desumanidade dos negros.Ao final do século XIX, a geração de 1880 – representada por Anténor Firmin, Hannibal Price e
Louis-Joseph Janvier – construiu um arcabouço teórico crítico antirracista e anticolonial (Crai-
pain, 2020; Rouchon, 1997). Destacaremos brevemente a contribuição de cada um desses autores,
porém com maior destaque para Anténor Firmin, que atualmente passa por um processo de (re)
descoberta13 nas Ciências Sociais. Carolyn Fluehr-Lobban (2000, 2005, 2007) defende que Anté-
nor Firmin é o pioneiro esquecido da Antropologia, cujo trabalho foi recuperado a partir dos anos

11 No original: “Je vais réveiller les cendres des nombreuses victimes que vous avez précipités dans le tombeau, et emprunter leurs voix pour dévoiler vos forfaits. Je vais exhumer ces malheureux que vous ayez enterrés vivans. Je vais interroger les mânes de mes infortunés compatriotes que vous avez jeté en vie dans des fours ardens ; ceux que vous avez fait embrocher,
rôtir, empaler, et mille autres tourmens divers inventés par l´enfer!”.

12 No original: “The landscape of Haiti is filled not only with spirits of the dead seeking rest and recognition but with other
corporeal spirits who re-call the terrors of slavery and the monstrous, institutionalized magic of turning humans into piec-es of prized and sexualized matter”.

13 Foi realizada uma pesquisa bibliométrica – técnica quantitativa e estatística sobre a produção do conhecimento – na qual
se constatou que, desde 2010, as publicações sobre Anténor Firmin foram crescentes, tendo uma edição, em 2014, da The
Journal of Pan African Studies dedicada ao pensamento do autor e, em 2021, a publicação do livro “Reconstructing the Social Sciences and Humanities: Anténor Firmin, Western Intellectual Tradition, and Black Atlantic Tradition”. No Brasil, esse pro-
cesso também está em andamento com a publicação dos artigos: “A Antropologia Haitiana e a Questão Racial no Século XIX”
(Déus, 2020), “Anténor Firmin, Jean Price-mars, Jacques Roumain: Antropólogos haitianos repovoando as narrativas históri-
cas da Antropologia” (Marques; Kosby, 2020) e “Raça, Colonialidade e Poder desde Anténor Firmin” (Troitinho, 2021).

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2000 com a tradução para o inglês. Louis-Joseph Janvier e Anténor Firmin14 participaram da Socie-
dade de Antropologia de Paris (SAP), fundada em 1859 por Paul Broca, a qual defendia a ideia de
hierarquização das raças. Os debates dentro da SAP dividiam-se entre o pensamento monogenista – apenas uma raça humana com uma variedade que explicava a diferença – e o poligenista – várias
raças humanas diferentes biologicamente (Firmin, 1885; Wartelle, 2004). Ambos os autores são
considerados neste artigo como os fundadores do paradigma da igualdade racial no século XIX.

Louis-Joseph Javier publicou “A República do Haiti e seus visitantes (1840-1882), respostas a Vic-
tor Cochunat (Petite Presse) e alguns escritores”, em 1883, e esteve na organização do livro “Os
detratores da raça negra e da República do Haiti”15, de 1882. Esse último é um compilado de en-
saios críticos produzidos por intelectuais descendentes de africanos tanto da Europa quanto na América, cujo objetivo era derrubar as teses racialistas a partir da experiência haitiana. Destarte, a existência dessa obra marca a presença crítica dos intelectuais haitianos do século XIX produzindo
críticas ao sistema escravagista dentro da Europa. Tanto que os autores solicitaram ao abolicionis-
ta francês Víctor Schoelcher para escrever a carta introdutória do livro, cujo argumento é a capa-
cidade do povo haitiano em fundar um Estado e como descendentes de uma linhagem de homens como Toussaint Loverture. O livro em questão conta com dois textos de Louis-Joseph Janvier, que
tratam de um posicionamento contestatório sobre a história haitiana produzida pelos intelectuais da ex-metrópole. Segundo Rouchon (1997), Janvier apontava que os estrangeiros que realizavam
pesquisa no Haiti deveriam se empenhar em conhecer mais do país em vez de produzirem análises
pejorativas, esquecendo-se da importância histórica que o país tinha para a humanidade. É essen-cial, nas reflexões do autor, o papel da revolução haitiana na libertação dos negros mundo afora.

Foi a independência do Haiti que determinou a emancipação dos negros nas colônias ingle-
sas, a fundação da Libéria, a emancipação dos negros na Martinica e mais tarde nos Estados Unidos [...] foi esta independência e autonomia do Haiti que exerceu pressão salutar sobre
certos governos e determinou a emancipação dos negros em Porto Rico e no Brasil16 (Javier,
1883, p. 56 apud Rouchon, 1997, p. 127).O pensamento de Janvier é categorizado a partir de três eixos: 1) a criação do paradigma da igual-dade das raças humanas a fim de derrotar o da desigualdade existente no século XIX; 2) criticar a herança francesa na cultura haitiana; 3) o progresso da África se encontrava no seio da República Haitiana (Garnica, 2020). A ideia de que o Haiti seria o exemplo paradigmático de uma “evolução”

natural e cultural da diáspora negra nas Américas fazia parte de uma teoria da “crioulização” de Lou-
is-Joseph Janvier (Craipain, 2020). Para fazer esse estudo, o autor recorreu à literatura haitiana, pois
acreditava que esse campo poderia fornecer uma análise alternativa ao discurso sobre o fracasso do Estado negro, o Haiti, que viajantes, etnográficos e jornalistas do século XIX produziam. A literatura
se transforma no seu horizonte de pesquisa para compreender aspectos linguísticos da cultura hai-
tiana e criar uma proposta epistemológica para a antropologia nascente mais ampliada.

14 Os autores participaram da SAP enquanto estavam em missão diplomática em Paris. Louis-Joseph Janvier foi primeira-
mente para terminar os estudos por meio de uma bolsa do governo haitiano, em 1877, e depois serviu como diplomata em
Londres e Paris (Garnica, 2020; Rouchon, 1997). Anténor Firmin foi enviado como diplomata a Paris em 1883 e ingressou
na SAP no ano seguinte pelo convite de Janvier (Price-Mars, 1978).

15 No original: “La république d’Haïti et ses visiteurs (1840-1882), réponse à m. Victor Cochinat (de la Petite presse) et à
quelques autres écrivains. Les détracteurs de la race noire et de la République d’Haïti”.

16 No original: “C’est l’indépendance d’Haïti qui a déterminé l’émancipation des noirs dans les colonies anglaises, la fonda-tion de Libéria, l’émancipation des noirs à la Martinique et, plus tard, aux États-Unis […] c’est cette indépendance et cette autonomie d’Haïti qui ont exercé une pression salutaire sur certains gouvernements et qui ont déterminé l’émancipation
des noirs à Puerto-Rico et au Brésil”.

9

As contribuições do pensamento haitiano para o giro decolonial

Na continuidade desse paradigma da igualdade apresentamos Anténor Firmin, cuja obra “Da
Igualdade das Raças Humanas” (1885) apresenta uma continuidade da proposta de Janvier em “A
Igualdade das Raças” (1883). Essa obra antecipou algumas das discussões que marcaram o século XX, como a comprovação de que a população do Egito Antigo era negra, a inexistência biológica de
raças humanas diferentes, bem como a noção de Antropologia Cultural desenvolvida por Frantz
Boas, o Pan-Africanismo (Casimir, 2017; Craipain, 2020; Delices, 2021; Fluehr-Lobban, 2005; Gar-
nica, 2020; Marques; Kosby, 2020; TROITINHO, 2021). É em torno dessa obra que se localizam as disputas em relação à interpretação da obra firminiana, assim como é o texto mais citado quando se propõe a refletir sobre o pensamento de Anténor Firmin.
A edição de 1885 do livro de Firmin apresentou uma ilustração de Toussaint L´Ouverture, um dos
grandes líderes da Revolução Haitiana, logo nas primeiras páginas. A Constituição de 1801, pro-mulgada por Toussaint, em seu artigo 3º, reafirmava a abolição da escravatura em São Domingos:
“Não pode haver escravos neste território, a servidão é abolida para sempre. Todos os homens
que nascem aqui vivem e morrem livres e franceses” (Janvier, 1886, p. 9 apud Logis, 2020, p. 39). O artigo quarto também é significativo ao derrubar as barreiras de ascensão política aos negros, afirmando que qualquer cidadão era elegível a cargos na colônia. A perspectiva de autonomia que
Toussaint tentava impor por meio da Constituição fora um dos motivos para sua captura em 1802
e sua morte, em 1803. As interpretações de Anténor Firmin sobre a Revolução Haitiana centrali-zaram-se na figura de Toussaint L’Ouverture.

Neste homem negro, cuja grande personalidade deve permanecer como um modelo im-
perecível, destinado a viver para sempre na memória e admiração de toda a sua raça, en-contramos o mais maravilhoso exemplo da espantosa e rápida evolução que os africanos
transbordados sofreram no Haiti17 (Firmin, 1885, p. 545, tradução nossa).

O autor ainda utilizou Toussaint para demonstrar como as teses da desigualdade não se aplicavam na experiência haitiana, afirmando que “quando uma raça produziu uma individualidade tão ma-
ravilhosamente dotada como Toussaint L’Ouverture, é impossível admitir que é inferior a outras,
sem demonstrar uma cegueira ou uma inconcebível falta de lógica”18 (Firmin, 1885, p. 555, tradu-
ção nossa). A publicação da obra de Firmin, em Paris, colocando a Revolução Haitiana como um caso de sucesso, mesmo quando outros autores a entendiam como fracasso, significou um legado
para as Ciências Sociais. Firmin e Janvier utilizaram a estratégia cosmopolita performativa para divulgar o pensamento social haitiano na ex-metrópole (Rath, 2021).
Escolhemos como título desta seção a frase “Todos os homens são homens”, verso de Victor Hugo
utilizado por Anténor Firmin na conclusão do seu livro “Da igualdade das Raças Humanas”, cujo argumento era que não existiam raças superiores – o que explicava as diferenças eram as organi-
zações culturais. “As raças são iguais; todos eles são capazes de escalar às virtudes mais nobres, ao
mais alto desenvolvimento intelectual, como cair na degeneração mais completa”19 (Firmin, 1885,
p. 662, tradução nossa). Para Firmin, a insistência europeia nas teses da desigualdade servia ape-

17 No original: “En ce Noir dont la grande personnalité doit rester comme un modèle impérissable, destiné à vivre éternel-le- ment dans le souvenir et l’admiration de sa race entière, on rencontre le plus merveilleux exemple de l’étonnante et
prompte évolution qu’avaient subie les Africains transportés en Haïti”.

18 No original: “Assurément, quand une race a produit une individualité aussi merveilleusement douée que l’était Toussaint-
-Louverture, il est impossible d’admettre qu’elle est inférieure à d’autres, sans démontrer un aveuglement ou une absence
de logique inconcevable”.

19 No original: “Les races sont égales; elles sont toutes capables de s’élever aux plus nobles vertus, au plus haut développe-ment intellectuel, comme de tomber dans la plus complète dégénération”.

10

Bruna Ribeiro Troitinho

nas para legitimar a escravidão e a exploração das populações negras. No capítulo “Hierarquização fictícia das raças humanas”, o autor afirma que “a doutrina antifilosófica e pseudocientífica da desigualdade das raças repousa apenas na ideia de exploração do homem pelo homem” (Firmin, 2022, p. 36). Ainda nessa análise das consequências lógicas das teses da desigualdade, Firmin afir-ma que a justificativa encontrada por essas teses para a existência da escravidão foi “a inferiori-
dade intelectual e moral (diminuio capitis) que, juridicamente, consideravam um atributo natural do escravo” (Ibidem, p. 38). Ao final, conclui Firmin sobre as teorias da desigualdade racial: “Não,
você não é uma ciência!” (Ibidem, p. 41).Segundo Elinet Daniel Casimir (2017), a perspectiva firminiana de igualdade é tanto do lado onto-lógico – a valorização do ser humano em sua condição existencial – como epistemológico – pensar
as pessoas como semelhantes aos seus pares, sendo dessa forma uma perspectiva que não propõe
um racismo antibranco ou uma superioridade às avessas do sujeito negro ou indígena. Para o au-
tor, a relevância da obra “Da Igualdade das Raças Humanas” consiste em demonstrar que o negro, em qualquer lugar que seja, pode aspirar à excelência como todo ser humano (Casimir, 2017). Na mesma perspectiva, Paul Mocombe defende que a egiptologia firminiana era mais universalista do
que as perspectivas acrocêntricas e do Movimento Negritude, pois demonstrava “a contribuição africana para as teorias sociais e científicas, destacando o cientificismo do povo africano do Haiti
como revelado pela religião do Vodu, a epistemologia haitiana, e sua forma de sistema e integração
social” (Mocombe, 2021, p. 196, tradução nossa).

Reler Firmin no século XXI implica discutir as marcas da colonialidade do poder nas disciplinas de
Ciências Sociais e Humanas. O livro “Reconstructing the Social Sciences and Humanities” dedicado ao
autor objetiva apresentar uma desconstrução das teorias convencionais sobre raça e povos nas Ciên-
cias Sociais e Humanas no mundo moderno, bem como construir uma narrativa alternativa a partir de
uma imaginação pós-colonial do desenvolvimento social e humano (Joseph; Mocombe, 2021). Firmin é
apresentado como um pensador transdisciplinar, cosmopolita, antirracista e anti-imperialista (Joseph,
2021). Com todas essas possibilidades de análise a partir do pensamento de Anténor Firmin, Celcuien Jospeh propõe que a releitura de Firmin no século XXI pensa formas de firminismo.

Formas de Firminismo envolvem criticamente várias disciplinas e campos de estudo nas Ciências Sociais e Humanas, incluindo, e não se limitando a, História Antiga da África ci-
vilização e cultura faraônica egípcia antiga), História Antiga e Moderna Europeia, Teoria
Política, História Geopolítica, Sociologia, Relações Internacionais e Economia. Formas de Firminismo referem-se a certos conceitos teóricos específicos e a um grupo de proposições
intelectuais originárias dos escritos e ideias de Joseph Anténor Firmin, incluindo o socialis-
mo, o democratismo, o universalismo, o liberalismo político, o humanismo, a fraternidade inclusiva, a fraternidade universal, o positivismo filosófico e científico, e a igualdade natu-
ral das raças humanas e essencialmente a igualdade das nações. O Firminismo considera
as ideias do Firmin como associadas à construção de Nações, governança, política, teoria
racial, religião, e assim por diante20 (Joseph, 2021, p. 88, tradução nossa).

20 No original: “Forms of Firminism critically engage various disciplines and fields of study in the Humanities and Social
Sciences, including, and not limited to, ancient African history (ancient Egyptian pharaonic civilization and culture), an-
cient and modern European history, political theory, geopolitical history, sociology, international relations, and economics. Forms of Firminism refer to certain specific theoretical concepts and a group of intellectual propositions that originated
from the writings and ideas of Joseph Anténor Firmin, including Firmin’s socialism, democratism, universalism, political liberalism, humanism, inclusive fraternity, universal brotherhood, philosophical and scientific positivism, and the natural
equality of the human races and essential equality of the nations. Firminism considers the ideas of Firmin as associated
with nation- building, governance, politics, race theory, religion, and so on”.

11

As contribuições do pensamento haitiano para o giro decolonial

Neste artigo, consideramos o pensamento de Anténor Firmin como precursor da ideia de Huma-
nismo Atlântico Haitiano: 1) pela proposta de igualdade humana; 2) por utilizar em sua análise
um amplo estudo das civilizações egípcia e haitiana, antecipando a produção de saber no Atlântico
Negro, proposto por Paul Gilroy; 3) pela luta anti-imperialista no caso do Môle de Saint-Nicolas; e
4) pela proposta metodológica e epistêmica de pensar as diferenças humanas partir de condições
históricas e culturais.

Hannibal Price é outro intelectual haitiano importante para o Humanismo Atlântico Haitiano.
Atuou como representante diplomático haitiano nos Estados Unidos entre 1890 e 1893. Foi du-
rante essa missão diplomática que escreveu sua obra “Da reabilitação da raça negra pela Repúbli-
ca do Haiti”21 em resposta às produções sobre o Haiti durante o século XIX, que o representavam como um país bárbaro (Déus, 2020). O livro foi publicado em 1898 pelos filhos, em Porto Príncipe,
cinco anos após a morte de Hannibal Price, em 1893. Outras obras de Price são “Os estudos sobre finanças e economia das Nações”, em dois volumes, e “Relatório sobre os trabalhos da Primeira
Conferência Panamericana”22.

“Da reabilitação da raça negra pela República do Haiti” foi organizado em duas partes, sendo a primeira uma reflexão sobre a identidade humana diante da diversidade das raças, na qual o autor
busca responder questões ontológicas como: “De onde viemos? O que nós somos? O que sou eu?”
(Price, 1898, p. 27), e a segunda uma discussão sobre o lugar do Haiti no mundo e seu papel de rea-
bilitação da raça negra por meio de seu legado histórico de luta pela libertação de todos os negros.
Segundo o autor, esse livro era uma orientação para as pessoas negras, em especial aos haitianos,
para combaterem a literatura dos intelectuais pró-escravidão que tentavam desmoralizar o Haiti.

A independência do Haiti é, portanto, importante para toda a raça negra, para a igualdade
social do negro com o branco, a supressão, senão de preconceitos individuais, mas de precon-
ceitos sociais
, só se realizará, por estas razões, através da vitória moral da República do Haiti,
contra a má vontade, contra a antipatia internacional que ainda encontra em quase todo o
lado. Pelas mesmas razões, a independência do Haiti é importante para a população branca
de todas as nações americanas23 (Price, 1898, p. 165, tradução nossa, grifos do autor).

No capítulo intitulado “Identidade da raça branca e da raça negra”, Price (1898) questiona qual a definição dada pelos intelectuais para o branco e o negro. No início desse capítulo, Price afirma “O
branco é um homem” a fim de demonstrar como a construção da linguagem e das ciências de sua
época colocavam o branco como a referência única de humanidade. A partir da leitura de Price po-demos perceber uma reflexão similar ao que Fanon (2008, p. 26, grifos do autor) nos apresenta na introdução de “Peles negras, máscaras brancas” quando afirma: “Mesmo expondo-me ao ressenti-
mento de meus irmãos de cor, direi que o negro não é um homem”. Referindo-se aos negros como
habitantes da “zona do não-ser”, faz uma crítica ao humanismo colonial o qual negara a presença dos negros. Fanon propõe um novo humanismo a partir da práxis radical dos condenados da terra
21 Nome original : “De la réhabilitation de la race noire par la République d’Haïti.”
22 Ambos os textos citados estão em francês cujos nomes originais são “Études sur les finances et l’économie des nations” e “Rapport sur les travaux de la Première conférence Pan- américaine”.
23 No original: “L’indépendance d’Haïti importe donc à la race noire tout entière, car l’égalité sociale du noir avec le blanc,

la suppression, sinon du préjugé individuel, mais du préjugé social n’arrivera, pour ces motifs, que par la victoire morale de la République d’Haïti, contre le mauvais vouloir, contre l’antipathie internationale qu’elle rencontre encore à peu près
partout. Pour les mômes motifs, l’indépendance d’Haïti importe à la population blanche de toutes les nations américaines”.

12

Bruna Ribeiro Troitinho

(De Oto, 2016; Faustino, 2021; Júnior; Pereira, 2021). É possível fazermos um diálogo entre o hu-
manismo proposto por Fanon e os escritos de Hannibal Price, primeiro pela crítica aos intelectuais
que categorizavam apenas o branco como ser humano, num segundo plano a análise da revolução
haitiana como ação radical de libertação dos escravizados.

O branco é um homem. De Platão a Descartes, de Plínio a Cuvier, ser ou coisa, aquilo a que,
dentro dos estreitos limites deste debate chamamos um branco, sempre foi designado na linguagem pela expressão homem. A este respeito, não há dúvida. Homem é anterior ao
branco. À pergunta: o que é um branco, a ciência e a consciência respondem: é um homem.
(Price, 1898, p. 130, tradução nossa, grifos do autor)24.

Assim, Price argumenta que as raças negras e brancas eram fruto do pensamento humano que
legitimava a desigualdade, ou seja, era uma construção social (Déus, 2020; Garnica, 2020). Após
analisar a perspectiva de Descartes, cuja diferença do ser humano para os animais era sua capaci-
dade de pensamento, Price reforçou que o negro também deveria ser um referente de humanida-
de, pois possuía a mesma capacidade intelectual que o branco. Se os autores da época produziam “o sofisma: o branco é um homem. O negro também é um homem. Mas ele é um homem inferior”25
(Price, 1898, p. 133, tradução nossa), Price refutou ao analisar a história haitiana. Para o autor, a
liberdade – no caso dos escravizados – e o acesso à educação eram os caminhos para que os po-
vos negros saíssem dessa zona de inferioridade. “A primeira necessidade, a primeira indicação do
verdadeiro interesse do ser humano em busca da felicidade é a educação. E por esta palavra en-
tendemos coragem e ciência, ou melhor, coragem e depois ciência”26 (Price, 1898, p. 146, tradução
nossa).

A independência do Haiti é, portanto, importante para toda a raça negra, porque a igualda-
de social do negro com o branco, a supressão, senão de preconceitos individuais, mas de
preconceitos sociais, só se realizará, por estas razões, através da vitória moral da República
do Haiti, contra a má vontade, contra a antipatia internacional que ainda encontra em qua-
se todo o lado. Pelas mesmas razões, a independência do Haiti é importante para a popula-
ção branca de todas as nações americanas27 (Price, 1898, p. 165 tradução nossa).Conforme a citação acima, Price (1898) identificava a necessidade de o Haiti alcançar uma vitória moral como uma resposta às desconfianças de viajantes escritores da época, os quais afirmavam

que o país era incivilizado. Em sua crítica, Price coloca em evidência o passado colonial haitiano como uma das causas dos problemas do país e não a ideia de raça como elemento definidor do
desenvolvimento haitiano.

24 No original: “Le blanc est un homme. De Platon à Descartes, de Pline à Cuvier, être ou chose, ce que, dans les limites étroites
de ce débat nous appelons un blanc, a toujours été désigné dans le langage par l’expression homme. À cet égard, il n’y a pas
pas de question. Homme est antérieur à blanc. À la question: qu’est-ce qu’un blanc, la science et la conscience répondent ;
c’est un homme”.

25 No original: “un sophisme : le blanc est homme. Le nègre est homme aussi. Mais c’est un homme inférieur”.
26 No original: “La première nécessité, la première indication de l’intérêt véritable de l’être humain cherchant le bonheur, c’est

l’éducation. Et par ce mot il faut entendre le courage et la science, ou plutôt le courage, puis la science”.
27 No original: “L’indépendance d’Haïti importe donc à la race noire tout entière, car l’égalité sociale du noir avec le blanc, la

suppression, sinon du préjugé individuel, mais du préjugé social n’arrivera, pour ces motifs, car l’égalité sociale du noir avec
le blanc, la suppression, sinon du préjugé individuel, mais du préjugé social n’arrivera, pour ces motifs, que par la victoire
morale de la République d’Haïti, contre le mauvais préjugé individuel, mais du préjugé social n’arrivera, pour ces motifs,
que par la victoire morale de la République d’Haïti, contre le mauvais vouloir, contre l’antipathie internationale qu’elle
rencontre encore à que par la victoire morale de la République d’Haïti, contre le mauvais vouloir, contre l’antipathie inter-nationale qu’elle rencontre encore à peu près partout”.

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As contribuições do pensamento haitiano para o giro decolonial

Foi objeto de pesquisa de Price a diferença entre o vodu e a superstição. Vale destacar que o vodu
foi repreendido ao longo da história haitiana devido à associação com superstição, ignorância
ou mesmo culto demoníaco. O efeito dessas associações em relação ao vodu foi tão forte que, em
1860, o governo haitiano assinou uma concordata com a Igreja Católica estabelecendo o catoli-cismo como religião oficial e realizando uma limpeza dos voduístas a fim de trazer “civilização,
o oposto da barbárie e da superstição representadas pela africanidade radical” (Hurbon, 1987,
p. 70). Na obra de Price (1898), o vodu foi pensado como um espaço de resistência no qual os
escravizados poderiam se organizar para derrubar a ordem escravagista da época. “Não houve culto a Deus ou ao diabo, nem sacrifícios à embriaguez ou ao amor; houve conspirações contra a
escravatura”28 (Price, 1898, p. 171 apud Rouchon, 1997, p. 139, tradução nossa). Assim, o au-
tor demonstra a importância do vodu para a coesão em São Domingues, desafiando as lógicas
escravagistas da época, desmentindo viajantes e intelectuais coloniais que atrelavam a religião
a práticas canibais.

Considerações finais

Este artigo apresentou intelectuais haitianos que fundaram uma proposta de interpretação do
mudo social a partir de uma perspectiva anticolonial, anti-imperialista e antirracista. Esses inte-
lectuais fundaram uma nova perspectiva de humanismo que inclui os povos colonizados na Amé-
rica Latina e pensa a luta de libertação dos povos escravizados desde o Haiti, a primeira república
negra.

O Humanismo Atlântico Haitiano pode se transformar numa lente de estudos das teorias críti-
cas ao colonialismo, assim como nova possibilidade de compreender a circulação de ideias pelo
Atlântico Negro. Apresentamos ao longo do artigo como intelectuais haitianos teorizaram sobre a
igualdade racial quando as teorias hegemônicas objetivavam a desumanização dos escravizados.
Defendemos que a Revolução Haitiana é uma sociogênese histórica do pensamento decolonial pela luta de libertação – o fim da escravidão e o reconhecimento da humanidade dos negros –, mas também pelas profícuas análises resultantes desse período histórico.
Consideramos que o processo de resgate desses intelectuais, em especial, Anténor Firmin, o qual
já está em curso, acrescentará outras narrativas para a formação das disciplinas de Ciências So-
ciais. Da mesma forma, esses autores e suas obras contribuíram para o giro decolonial ao regis-
trarem a memória apagada pela Europa dos mortos da escravidão, como foi o caso do Barão de
Vastey, lutando contra a colonialidade do saber. A produção de Hannibal Price ao discutir com Descartes, acrescentando o homem negro como um ser pensante, apresenta pistas para refletir-
mos a colonialidade do humanismo ocidental. Esperamos que este artigo contribua com o debate
decolonial ampliando nossas referências e fazendo o encontro, ainda necessário, com os intelec-
tuais caribenhos.

28 No original: “On n´y adorait ni Dieu, ni diable, on n´y sacrifiait ni à l´ivresse ni à l´amour ; on y complotait contre l´esclavage”.

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Bruna Ribeiro Troitinho

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As contribuições do pensamento haitiano para o giro decolonial

The contributions of Haitian thought
to the decolonial turn: Baron de Vastey,
Anténor Firmin, Louis-Joseph Janvier and
Hannibal Price

Abstract: The decolonial turn is an unfinished project of glo-bal order that examines other forms of knowing,
power, and being. In this article, we present the
theorical contributions of Haitian intellectuals Ba-
ron de Vastey, Anténor Firmin, Louis-Joseph Jan-
vier, and Hannibal Price to the decolonial turn. The
contributions of these authors were not limited to denouncing the falsifiability of the nineteenth-
-century concept of human “races”, but they also
thought about a new conception of human being
that encompassed enslaved peoples. Analyzing the
contributions of these authors, we perceive some clues that allow us to think that their works are
precursors in critical theories of colonization.
Keywords: Haitian thought. Decolonial turn. Hai-
tian intellectuals. Anténor Firmin. Haitian Atlantic
Humanism.

Las contribuciones del pensamiento
haitiano al giro decolonial: Barón de
Vastey, Anténor Firmin, Louis-Joseph
Janvier y Hannibal Price

Resumen:
El giro decolonial es un proyecto inacabado de
orden global que analiza otras formas de saber,
poder y ser. En este artículo, presentamos las con-
tribuciones teóricas de los intelectuales haitianos
Baron de Vastey, Anténor Firmin, Louis-Joseph
Janvier y Hannibal Price al giro decolonial. Los
aportes de esos autores no se limitaron a denun-
ciar la falsedad del concepto de “razas” humanas
del siglo XIX, sino que pensaron en un nuevo con-
cepto del ser humano que englobara a los pueblos
esclavizados. Al analizar los aportes de esos au-
tores, percibimos algunas pistas que nos permit-
en pensar que sus obras son precursoras en las
teorías críticas de la colonización.
Palabras clave: Pensamiento haitiano. Giro deco-
lonial. Los intelectuales haitianos. Anténor Firmin.
Humanismo Atlántico Haitiano.