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“Todo mundo tem corpo de biquíni”: problematizando a
gordofobia e padrões de feminilidades a partir do filme
“Dumplin‘” (2018)
Elaine de Jesus Souza
1
Eugerbia Paula da Rocha
2
Claudiene Santos
3
Resumo:
Neste estudo, analisamos discursos sobre feminismos e feminilidades juvenis no contexto escolar do Cariri
cearense a partir da problematização de artefatos culturais. A pesquisa contou com 13 estudantes jovens
mulheres de escolas públicas estaduais, por meio de uma entrevista coletiva, com a análise foucaultiana
do discurso para examinar o material empírico. Os resultados obtidos evidenciaram que as feminilidades
juvenis são marcadas por padrões normativos estereotipados,
bullying
, violências e preconceitos, como a
gordofobia, bem como o não reconhecimento das múltiplas feminilidades. Assim, concluímos enfatizando
a importância de incorporar o debate sobre os feminismos e as feminilidades nos currículos escolares e
acadêmicos.
Palavras-Chave: Feminilidades. Feminismos. Gênero. Gordofobia. Cinema.
Introdução
No nosso cotidiano ainda é frequente o uso de expressões e/ou termos pejorativos como: “Bela,
recatada e do lar”, “sexo frágil”, “mulher no volante perigo constante”. Embora sejam banalizados,
tais enunciados polarizam e reiteram hierarquias de gênero, reforçando preconceitos e a “subor-
dinação” das mulheres. Como consequência dessas violências psicológicas e verbais (nem sempre
reconhecidas), ampliam-se a vulnerabilização feminina desde a juventude, em face da “cultura do
estupro”, assédios, abusos e práticas de violências físicas e emocionais fora e dentro de casa, como
também na escola. Tais violências são marcadas, principalmente, pelas desigualdades de gênero,
perpetuando o machismo na sociedade patriarcal que sustenta e reforça as relações de poder. Por
isso, é importante problematizar a linguagem misógina, sexista e machista que (re)produz pre-
conceitos e desigualdades de gênero na sociedade e, especificamente, no contexto escolar.
1
Universidade Federal do Cariri/UFCA. Programa de Pós-Graduação em Ciências e Matemática da Universidade Federal de
Sergipe. Juazeiro do Norte, Ceará, Brasil. E-mail:elaine.js.sd@hotmail.com https://orcid.org/0000-0003-3931-0025
2
Universidade Federal do Rio Grande/FURG. Programa de pós-graduação em educação (FURG). Brejo Santo, Ceará, Brasil.
Email: eugerbiarochabs@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-1459-2428
3
Universidade Federal de Uberlândia/ Pontal; Instituto de Ciências Humanas do Pontal. Ituiutaba, Minas Gerais, Brasil.
Email: claudiene.santos@ufu.br https://orcid.org/0000-0002-2337-9370
Revista TOMO
São Cristóvão, v. 42, e18290, 2023
Data de Publicação: Junho/2023
Dossiê
Dossiê
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2
Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
De acordo com as estatísticas da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS)
4
, entre 2018 e
o primeiro semestre de 2020, o Ceará registrou a morte de 74 mulheres vítimas de feminicídio. Sendo
13 óbitos registrados apenas nos primeiros seis meses de 2020, ou seja, todas foram mortas pela con-
dição de seu gênero, e, na maioria das vezes, os criminosos foram seus próprios (ex)companheiros que,
em muitos casos, protagonizaram uma sequência de episódios violentos até se tornarem feminicidas.
Nesse contexto, justifica-se a necessidade de incluir, de forma contínua e sistemática, nos espaços
educacionais as temáticas sexualidade, gênero, feminismos, feminilidades, visando problematizar
e desconstruir preconceitos, violências e essencialismos produzidos culturalmente, que marcam
as vivências de jovens, em especial os corpos femininos
5
, no ambiente escolar. É necessário pro-
mover o conhecimento em um sentido amplo, para além de abordagens conteudistas, cujo ponto
de partida seria compreender os feminismos e começar, no contexto escolar, a questionar dis-
cursos machistas/misóginos/sexistas, reverberando vozes e visibilizando as lutas, as vivências e
as narrativas das jovens estudantes. Ultrapassar as fronteiras de gêneros e desconstruir padrões
estéticos e rótulos estereotipados atribuídos às mulheres ao longo da história para desfazer tabus
que cercam essas temáticas em todas as suas nuances.
Artefatos culturais, como filmes e séries, podem ser utilizados para problematizar desigualda
-
des de gênero que permeiam a sociedade e a escola ao trazerem essas temáticas para os espaços
educacionais, sobretudo, escolas e universidades, engajando o público juvenil e adultos/as para
discutir os machismos, os sexismos, os padrões hegemônicos de feminilidade e outros preconcei-
tos. Nessa direção, este trabalho teve como questões norteadoras da pesquisa: Que discursos são
(re)produzidos nas escolas acerca de feminismos, feminilidades, padrões de beleza e gordofobia?
Como as desigualdades de gênero perpassam os muros das escolas e como estão presentes em
distintos artefatos culturais e espaços sociais e educacionais? Assim, o principal objetivo
foi ana-
lisar discursos sobre feminismos e feminilidades juvenis no contexto escolar do Cariri cearense,
a partir da problematização de narrativas discentes desencadeadas pelo filme “Dumplin’” (2018).
“Dumplin’”
6
é um filme norte-americano, lançado em 2018, na plataforma Netflix, com duração
de 1 hora e 50 minutos, dirigido por Anne Fletcher e roteirizado por Kristin Hahn. Seu elenco
foi composto por Jennifer Aniston (Rosie Dickson), Danielle Macdonald (Willowdean Dickson),
Harold Perrineau (Lee Wayne), Odeya Rush (Ellen Dryver), Dove Cameron (Bekah Colter), Luke
Benward (Bo) e Maddie Baillio (Millie). O filme foi classificado como gênero comédia/drama/
musical e narra a história da jovem Willowdean Dickson/Wil (Danielle Macdonald), uma garota
acima do peso e bastante confiante com seu próprio corpo, apesar da desaprovação de sua mãe,
uma ex-miss que vive no mundo da moda e organiza concursos de beleza. Quando Willowdean se
apaixona pelo atleta Bo (Luke Benward) começa a ter inseguranças, então, a jovem decide entrar
em um concurso de beleza como forma de protesto.
A escolha desse filme justifica-se por constituir um artefato cultural potente ao abordar temáticas
contemporâneas que precisam ser constantemente discutidas. Além disso, seu enredo, direcio-
nado ao público juvenil, envolve cenas no espaço escolar, aproximando-se de situações vivencia-
das por muitos/as jovens. O filme “Dumplin’” possibilita problematizar assuntos como
bullying
,
4
Disponível em: https://www.sspds.ce.gov.br/estatisticas-2/. Acesso em 18 nov. 2020.
5
Bento (2016, p. 54) traz a noção de feminino abjeto, corpos “travestis, mulheres trans e mulheres transexuais, gays femini-
nos e meninos femininos”, desvinculando-os dos corpos construídos como mulheres” e “sugere que o feminino é o lugar do
abjeto, do impuro, contaminado e contaminável”.
6
Disponível em: https://www.netflix.com/br/title/80201490. Acesso em 16 ago 2020.
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3
“Todo mundo tem corpo de biquíni”
padrões estereotipados de beleza, autoaceitação, amor-próprio, relações familiares e maternas,
diferentes feminilidades, gordofobia, romance e Miss Teen
7
.
1. Gênero, feminismos e feminilidades: articulações com os Estudos Culturais
Existem várias vertentes teóricas no campo dos Estudos Culturais, destacamos duas como maior
aproximação de nosso estudo, sendo os Estudos Culturais latino-americanos e os Estudos Cultu-
rais pós-estruturalistas. Os Estudos Culturais latino-americanos têm sido marcados por polêmicas
de um campo contestado, mas também grandes avanços, sobretudo ao refletir sobre os distintos
espaços educacionais como dimensões socioculturais e políticas. A América Latina representa
uma subdivisão regional constituída por países, como o Brasil e a Argentina, com características
econômicas e socioculturais semelhantes decorrentes de um passado histórico colonial.
Costa, Silveira e Sommer (2013, p. 10) destacam que os Estudos Culturais latino-americanos consti-
tuem um campo de estudos polifônico e multitemático envolvido na tradição crítica latino-americana.
Nesse rumo, os Estudos Culturais latino-americanos se interessam por distintos “processos e artefatos
culturais de seus povos, na cotidianidade das suas práticas de significação, na contemporaneidade de
um tempo em que as fronteiras entre o global e o local se relativizam, se interpenetram e se modificam”
(Costa; Silveira; Sommer, 2003, p. 48). Embora exista uma discussão envolvendo as questões dos Es-
tudos Culturais latino-americanos, pós-colonialidade e a pós-modernidade, neste estudo, adotamos os
Estudos Culturais na perspectiva pós-crítica, entendendo como um amplo campo de estudos relacio-
nado com culturas, discursos e produção de significados. Nessa esteira teórica dialogaremos com auto
-
res/as como: Michel Foucault (1996, 2015), Guacira Lopes Louro (1997, 2000, 2017), Linda Nicholson
(2000), Dagmar Meyer (2014), Tomaz Tadeu da Silva (2015), Margaret A. Mclaren (2016), Raewyn
Connell e Rebecca Pearse (2015), Dinah Beck e Bianca Guizzo (2013), entre outros/as.
Em uma entrevista, Connell enuncia o conhecimento, nas suas múltiplas áreas e dimensões, como
algo (re)construído socioculturalmente na esfera mundial, portanto demanda uma análise histó-
rica do colonialismo e a manutenção das desigualdades econômicas e de poder, visto que “à luz da
autoridade cultural do Norte global você sequer precisaria usar o termo “Sul global” (Rodrigues;
Andrade; Mano, 2015, p. 67). Desse modo, cabe explanar que:
As perspectivas pós-coloniais compartilham do caráter discursivo do social, do descen-
tramento das narrativas e de sujeitos contemporâneos, do método da desconstrução dos
essencialismos, e principalmente da proposta de uma epistemologia crítica às concepções
dominantes da modernidade. O colonialismo refere-se à relação de opressões diversas, a
partir de fronteiras de gênero, etnia ou raça (Stwart, 2017, p. 69).
Nesse sentido, Connell e Pearse (2015, p. 146) argumentam que “
[...] Fazer e refazer o gêne-
ro é um processo entrelaçado com a produção da raça e as dinâmicas do capitalismo global”. En-
tretanto, as perspectivas pós-colonial e neocolonial ultrapassam críticas ao racismo e às análises
de gênero, posto que é necessário reconhecer e aprender com as experiências de outros/as a par-
tir de “uma perspectiva de viajante do mundo”. Desse modo, as representações de feminilidades
e masculinidades veiculadas na mídia global (música, filmes, séries, moda...) refletem diferentes
7
Miss Teen é um concurso de beleza organizado para jovens entre 14 a 19 anos de idade em uma pequena cidade do Texas,
nos Estados Unidos.
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Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
culturas que operam na (re)produção simbólica de gênero, logo para que novas conexões e práti-
cas sejam (re)criadas são necessárias interações
entre ordens locais e globais das relações de
gênero (
Connell; Pearse, 2015
).
Aqui, entendemos os Estudos Culturais como um campo transdisciplinar, que instiga a incessante
problematização de artefatos, saberes e práticas relacionados às culturas, como uma arena de pro-
dução de múltiplos significados em uma heterogeneidade discursiva. Levando em consideração
saberes e práticas de diferentes grupos sociais, que lutam por uma sociedade democrática, justa
e igualitária (Costa; Silveira; Sommer, 2003; Silva, 2015). Os Estudos Culturais aliados às teorias
foucaultianas constituem potentes espaços para contestação de discursos marcados por relações
de poder-saber, que reverberam em lutas contra as desigualdades sociais e de gênero.
Para Foucault (1996), os discursos que sustentam a seleção dos conhecimentos que constituem o
currículo são estabelecidos a partir de um campo de ação para “governar sujeitos”. Em contraponto,
os Estudos Culturais na educação possibilitam colocar sob questionamento o currículo “disciplinar”,
“conteudista”, e ampliar a visão para além dos “muros da escola”. Englobando,
também, as questões
socioculturais, sobretudo ao envolver discussões sobre identidades e diferentes processos de cons-
tituir-se como sujeitos por meio da cultura. Nesse contexto, os Estudos Culturais em sua perspectiva
pós-estruturalista instigam um olhar atento e problematizador acerca das relações de poder.
Para Meyer (2014, p. 51), “a teoria pós-estruturalista tem privilegiado o exame de processos edu-
cativos assistenciais e de artefatos culturais”, possibilitando questionar a linguagem para descons-
truir aquilo que é tido como natural, assim atribuindo-lhes novos significados. Essa perspectiva
teórica tem se mostrado bastante produtiva para provocar reflexões aos/às pesquisadores/as,
deixar para trás “certezas absolutas”, apontando novas rotas e percursos sem a necessidade de
uma resposta ou solução imediata (Beck; Guizzo, 2013).
Neste estudo, utilizamos artefatos culturais como instrumentos analítico-investigativos acerca de
discursos referentes aos feminismos e às feminilidades no contexto escolar, em uma perspectiva
pós-estruturalista. Podemos destacar as pedagogias culturais como uma ferramenta teórica pro-
dutiva que surgiu a partir da aproximação dos processos educacionais com a cultura, a política e
o poder. Tais pedagogias promovem reflexões sobre as desigualdades e as distintas identidades,
que aliadas às diferentes classes sociais são as que mais causam exclusão social e desigualdades
de gênero disseminadas na sociedade (Andrade; Costa, 2015).
Dessa forma, o movimento feminista surge como um campo de estudos e teorias que incitam refle
-
xões e críticas das condições impostas às mulheres na sociedade, contribuindo para as conquistas
de direitos e espaço social. O feminismo, em suas múltiplas vertentes, de modo geral, pode ser
entendido como um movimento que reivindica os direitos sociais e políticos das mulheres e surgiu
com a intenção de romper o patriarcado (Oliveira; Cassab, 2014; Silva, 2008). Por outro lado, o
machismo engloba atitudes e expressões que desrespeitam e inferiorizam as mulheres (e homens
que se afastam do padrão hegemônico), enquanto o feminismo constitui um movimento social que
luta pela igualdade/equidade de direitos entre os gêneros (Rosa; Felipe; Leguiça, 2019).
O conceito de gênero engloba múltiplas expressões de corpo e representações de masculinidades
e feminilidades, que excedem os limites do sexo biológico e a noção de “papéis sexuais”. Nessa
perspectiva, gênero pode ser compreendido como uma construção sociocultural em nossa cons-
tituição como homens e mulheres, englobando processos educativos que operam por meio de/ou
se apoiam em distintas instituições, não necessariamente convergentes, harmoniosas e estáveis.
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“Todo mundo tem corpo de biquíni”
Consiste em um processo mutável e inacabado, passível de transformação ao longo da vida (Meyer,
2013; Nicholson; 2000; Scott, 1995).
Além de discutirmos sobre a dimensão de gênero, também é importante entender a sexualidade.
Para Louro (1997), a sexualidade abrange distintas dimensões, tais como desejos, pensamentos, va-
lores, comportamentos, experiências, representações de linguagens e identidades, construídas so-
cioculturalmente ao longo da vida dos sujeitos. Partindo desse pressuposto, não existe uma defini
-
ção única nem um padrão para a sexualidade humana, visto que resulta de uma construção histórica
e sociocultural, não sendo algo dado, e, portanto, é inacabada, pois é passível de transformações.
Em “História da Sexualidade I”, Foucault (2015) argumenta que, ao longo do século XIX, a sexua-
lidade humana estava diretamente vinculada aos discursos fisiológicos e anatômicos, limitada à
dimensão sexual e reprodutiva, inscrita em dois campos do saber: Biologia e Medicina. Ou seja, a
sexualidade seria resumida ao sexo, deixando-se de lado suas dimensões culturais, portanto, os
saberes biológicos e médicos alicerçaram o que Foucault chamou de “dispositivo de sexualidade”.
Nesse sentido, para Foucault (2015, p. 116) “[...] o dispositivo de sexualidade funciona como técni-
cas móveis, polimorfas e conjunturais de poder”. Esse dispositivo opera como mecanismo de con-
trole da população, dos corpos e das subjetividades, a partir de técnicas de disciplinamento que
regulam e prescrevem padrões para vivenciar os prazeres e os desejos sexuais (Foucault, 2015).
É importante destacar as dimensões de gênero nos processos de constituição das masculinidades
e feminilidades (re)produzidas na e pela cultura. Embora não exista uma única definição para fe
-
minilidades e, justamente por isso, escrevemos a palavra no plural. Neste estudo, assumimos essa
categoria como as múltiplas formas de “tornar-se mulher”, abrangendo distintas identidades/dife-
renças, dimensões e marcadores sociais além de gênero, tais como sexualidade, raça/etnia, classe
e geração. Dornelles (2007) aponta que as masculinidades também pressupõem formas plurais de
“tornar-se homem”, envolvendo distintas dimensões, instituições sociais, comportamentos, emo-
ções, posto que não são polos fixos nem imutáveis, mas provisórios e passíveis de transformações.
Além disso, também são (re)produzidos padrões sociais e estéticos em torno dos corpos, princi-
palmente femininos, os estereótipos de gênero. Nesse contexto, a gordofobia surge como uma for-
ma de discriminação disseminada nos mais variados espaços socioculturais, como a mídia, cons-
tituindo signos que veiculam significados negativos a pessoas gordas, afetando principalmente as
mulheres em distintas esferas socioeducativas (Souza; Gonçalves, 2021). A escola como um lugar
de formação humana pode tornar-se um espaço potente para aprendizados sobre feminilidades,
masculinidades, sexualidades, pluralidade e diversidade de corpos, que permitam uma ruptura
de estereótipos de gênero e dicotomias. Contudo, embora essas temáticas estejam presentes nos
espaços escolares, de forma direta ou indireta, ainda se encontram distantes de um planejamento
curricular e das práticas de ensino e aprendizagem.
2. Modos de fazer a pesquisa de campo
Este estudo trata-se do recorte de uma pesquisa qualitativa, realizada em três escolas da educação
básica de ensino do município X, que objetivou analisar as narrativas de jovens/mulheres estu-
dantes acerca de feminismos e feminilidades no contexto escolar. Os procedimentos investigativos
envolveram a realização de três entrevistas coletivas com sete jovens mulheres, estudantes de
escolas públicas do Ensino Médio. Adotamos entrevistas semiestruturadas para melhor compre-
ender as narrativas das participantes sobre feminismos e feminilidades no contexto escolar. Para
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Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
Ribeiro e Ávila (2013, p. 72), narrativas podem ser entendidas “como práticas sociais que cons-
tituem os sujeitos”, os relatos das histórias refletem os modos de construção de si mesmos/as, a
partir de enunciados que constituem uma pluralidade de discursos.
Tendo como metodologia a investigação narrativa e como ferramenta a produção de entrevista co-
letiva em grupo, realizada de forma virtual por meio da plataforma digital Google Meet, devido ao
cenário de distanciamento social ocasionado pela pandemia da Covid-19. Flick (2009) destaca que
a técnica de entrevista online é uma forma de adaptação das entrevistas convencionais podendo
ser organizada de forma “síncrona” ou “assíncrona” e, no caso deste trabalho, foram síncronas, ou
seja, online em tempo real e coletivas.
Nessa perspectiva, as entrevistas coletivas facilitam as interações entre os/as participantes e per-
mitem capturar um leque de enunciados e práticas discursivas, a partir de contradições e opiniões
distintas. Nosso foco principal consiste em observar divergências e convergências acerca das nar-
rativas e vivências estudantis sobre feminismos e feminilidades no contexto escolar. Neste artigo,
analisaremos somente a segunda entrevista coletiva para a problematização do filme “Dumplin’”
(2018) relacionando com o objeto de estudo. O encontro virtual teve duração aproximada de 1
hora e 42 minutos. Previamente, via grupo no WhatsApp
,
foram passadas as informações sobre as
etapas da pesquisa e combinados com as participantes, sendo solicitado que assistissem o filme
para a discussão no segundo encontro coletivo. Assim, as entrevistas coletivas semiestruturadas
ocorreram com base nas perguntas gerais sobre as temáticas gênero, feminismos, machismos,
feminilidades, masculinidades e gordofobia no contexto escolar, sendo as sessões gravadas e pos-
teriormente transcritas.
O filme “Dumplin’” tece uma crítica aos estereótipos, ao
bullying
e aos padrões de beleza reite-
rados pelo patriarcado, que propagam inseguranças, sofrimentos com o corpo gordo, por não se
enquadrar nos padrões estéticos. Por outro lado, o longa-metragem
exibe uma multiplicidade de
identidades/diferenças femininas, instigando a (auto)aceitação, o reconhecimento e a descons-
trução de padrões sociais ao retratar a vida de uma jovem que luta contra o
bullying
e a gor-
dofobia. A garota, Wil, passou a maior parte da sua vida sendo criada por sua tia Lucy (Hilliary
Begley), que estimulava a sobrinha sobre autoaceitação, por também ser uma mulher gorda. Lucy
lhe apresentou sua melhor amiga Elen (Odeya Rush), que, ao contrário de Wil, se encaixava nos
padrões normativos hegemônicos de beleza. Wil trabalha em um restaurante
fast food
, onde inicia
um romance com outro funcionário, mas a garota se julga incapaz de viver o romance por estar
acima do peso. Segundo ela, garotos como o Bo (Luke Benward) não se interessariam por uma
garota “gordinha” como ela. A jovem sofre
bullying
tanto na escola quanto por parte da sua mãe
Rosie (Jennifer Aniston), que a chama pelo apelido “fofinha”, reiterando de uma forma velada a
gordofobia e a não aceitação da filha por quebrar os padrões socioculturais idealizados de beleza.
Como procedimento analítico adotamos a análise foucaultiana do discurso para problematizar
de que modos os feminismos e as feminilidades são (des)construídos no contexto escolar e que
discursos são (re)produzidos nesse espaço educacional a partir da problematização de narrativas
discentes em relação ao filme “Dumplin’” como artefato cultural. Foucault (1996, p. 135) enfati
-
za “o discurso como um conjunto de enunciados que se apoiem na mesma formação discursiva”.
Vale ressaltar que, os enunciados, nesse sentido, não são só as “coisas”, mas também os próprios
acontecimentos. A análise do enunciado instiga um olhar investigativo e dialogado para pensar as
condições de existências e problematizar a materialidade e os efeitos de “verdades” que compõem
os discursos produzidos por meio de vivências do cotidiano (Silveira, 2007).
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“Todo mundo tem corpo de biquíni”
Ademais, salientamos que tal recorte analítico decorre de uma pesquisa mais abrangente
8
, apro-
vada pelo Comitê de Ética/CEP, que atendeu todos os procedimentos éticos, desde a escolha do
objeto de estudo até a elaboração e a organização do estudo. Foram usados nomes fictícios para
todas as participantes e cada uma assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e
o familiar responsável autorizou a participação por meio da assinatura do Termo de Assentimento
Livre e Esclarecido (TALE), concordando com a participação voluntária na pesquisa.
No quadro 1, apresentamos o perfil sociodemográfico das participantes com seus respectivos no
-
mes fictícios, utilizados para assegurar o sigilo sobre toda e qualquer informação, destacamos as
identidades sexuais e de gênero autodeclaradas, faixa etária e religião.
Quadro 1- Perfil das participantes das entrevistas coletivas
NOMEIDENTIDADE DE GÊNERO IDENTIDADE SEXUALIDADE RELIGIÃO
MelissaFemininoHeterossexual 17 anosCatólica
LauraFemininoHeterossexual17 anosCatólica
KelyFemininoHeterossexual18 anosEvangélica
PérolaFemininoHeterossexual17 anosEvangélica
EvaFemininoHeterossexual17 anos Católica
BiancaFemininoHeterossexual17 anosCatólica
LorenaFemininoBissexual18 anosAteia
Fonte:
Entrevista coletiva realizada pela coautora da pesquisa.
Dessa forma, o grupo participante foi composto por alunas de três escolas: sendo uma profissio
-
nal que funciona em tempo integral, uma do ensino regular e outra da Educação Jovens e Adultos
(EJA), todas ofertam o Ensino Médio, mas com distintas modalidades de ensino. Essa escolha de
discentes de diferentes modalidades de ensino justifica-se pela dificuldade de contato e disponi
-
bilidade de algumas participantes para realizar a pesquisa, sobretudo devido ao contexto pan-
dêmico vigente na época. Assim, a fim de capturar os enunciados e seus múltiplos significados,
tal estudo buscou problematizar discursos sobre gênero, feminismos e feminilidades a partir das
narrativas de jovens/mulheres estudantes.
3. Representações de gênero no filme “Dumplin’”: problematizações e (des)construções a
partir de narrativas estudantis
As representações de gênero presentes nas cenas do filme “Dumplin’” nos provocam questionamen
-
tos e problematizações acerca de feminismos, feminilidades e o processo de construção das identi-
dades/diferenças, envolvendo questões de exclusões e preconceitos como a gordofobia. Desse modo,
capturamos os principais enunciados das falas que serão expostas. Serão analisadas as respostas das
jovens entrevistadas sobre as cenas que tenham relação com feminismos e feminilidades.
8
“Educação Sexual, sexualidade e gênero na escola em uma perspectiva sociocultural” aprovada pelo CEP da instituição
proponente, cujo CAAE é 21861219 0 0000 5698 com número de parecer 3.672.498.
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Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
Quadro 2 - Cena do filme que mais chamou atenção e tenha relação com feminismos e feminilidades
Pérola:
[...]
quando as meninas se inscreveram no concurso. Pelo fato delas serem diferentes, cada uma ser mulher de
sua maneira.
Laura:
Eu gostei muito da parte que Mily ganhou o concurso, eu achei muito emocionante por ela ter conseguido [...]
porque ela sempre teve esse sonho desde criança em participar desse concurso, só que por causa dos “padrões” ela não
participava dos concursos.
Melissa:
A parte em que o menino fala que gosta dela. Porque ela se questiona sobre o corpo, quando diz “você gosta
disso?” Fica se perguntando por que ele gostaria dela, ela sendo “daquele jeito” [...].
Lorena:
Eu vi mais destaque na relação dela com a mãe. Porque em casa ela sofria bastante, a mãe dela costurava vários
vestidos lindos e todos eram para pessoas super magras, como se mãe dela tivesse que estar sempre “naquele ponto
certo” e ela se sentia meio que deslocada do que a mãe fazia e tal... E a mãe sempre cobrando, sempre falando pra ela se
vestir nos padrões [...] Até o apelido que a mãe colocou nela, “fofinha”, ela não gostava porque relacionava esse apelido
com pessoas gordas, aí ela se sentiu ofendida [...] Acabou sofrendo um pouco na escola, sempre teve muito
bullying
.
Kely:
A parte que as pessoas não aceitavam o estilo de vida dela, o conforto que ela sentia com o corpo, do jeito que ela
estava, estava tudo bem. Só que tinham muitas pessoas que ficavam julgando-a, por ser mais gordinha, por não estar em
forma, por ela não ser “bem feita de corpo” isso magoou muito ela [...] porque é um padrão que a sociedade não gosta,
quer dizer “não gosta da forma que a gente gosta”.
Bianca:
Só pelo fato das meninas que estão “fora dos padrões” participarem do filme já foi uma causa feminista. O fato
de não se importarem com olhares dos demais, principalmente dos meninos, já que no meio deles o preconceito é bem
maior.
Eva:
Quando ela encontra o papel da tia que ia se inscrever no concurso, e vê que a tia desistiu pelo fato das meninas
que se inscreviam no concurso serem magras, e a tia era mais gordinha. Então, ela entra no concurso pra homenagear a
tia e afrontar a mãe, mas ela não esperava que o concurso fosse tomar tal proporção; que inspirava outras meninas. E a
relação dessa cena com o feminismo é a parte da autoaceitação, porque a gente vê que tem muitas meninas que não se
aceitam ou são julgadas por serem mais gordinhas [...].
Fonte: Elaborado pela coautora a partir da entrevista coletiva em 18/09/2020.
Ao relacionar o filme com feminismos e feminilidades, as falas de
Pérola e Bianca convergem,
respectivamente, quando ressaltam a inclusão das múltiplas feminilidades e a quebra dos padrões
ao destacarem a participação das quatro meninas no concurso “pelo fato de serem diferentes,
cada uma ser mulher de sua maneira”; “Só pelo fato das meninas que estão “fora dos padrões”
participarem do filme já foi uma causa feminista”
,
sinalizando a desconstrução da “feminilidade
hegemônica”, ampliando um leque de possibilidades de expressar e vivenciar as múltiplas femini-
lidades, representando o feminismo pós-moderno, quando problematiza o conceito de identidade
singular e questiona as normas tradicionais. Vale ressaltar que, embora o feminismo tenha várias
vertentes, todas reconhecem a opressão estrutural que afeta a vida de muitas mulheres, e, inde-
pendentemente de suas particularidades, têm em comum a luta e o compromisso com a inclusão,
a igualdade e a equidade de gênero (McLaren, 2016).
Apesar de diferentes vertentes do feminismo convergirem na luta pela liberdade e independência
das mulheres, é importante salientar as peculiaridades do feminismo negro, sobretudo nos países
africanos, o que levou ao conceito de “
Womanism
” da nigeriana Chikwenye Okonjo Ogunyemi. Para
reforçar que movimentos feministas “devem ser postos em prática de formas diferentes no Norte
branco e Sul negro global. Isso se dá porque o “Womanism” é uma forma de Feminismo que supera
questões de gênero, adentrando no âmbito das questões de raça e classe social” (Stwart, 2017, p.
80). Aqui no Brasil, o feminismo negro vem conquistando maior visibilidade em diferentes artefa-
tos culturais midiáticos, como redes sociais, filmes e novelas, a partir de distintas pesquisadoras
feministas como Conceição Evaristo, Lélia Gonzalez e Djamila Ribeiro. Nesse filme norte-ameri
-
cano “Dumplin’”, as personagens principais são brancas e a representatividade étnico-racial não
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“Todo mundo tem corpo de biquíni”
foi destaque, o que demanda problematizações e questionamentos acerca do preconceito e da
invisibilização das mulheres negras.
Quando a participante Bianca ressalta o fato de não se
“importarem com olhares dos demais, prin-
cipalmente dos meninos, já que no meio deles o preconceito é bem maior”,
ao se referir às garotas
obesas, vale problematizar a questão do preconceito, nesse caso, especificamente a gordofobia.
Nesse sentido, a gordofobia pode ser nomeada como preconceito, discriminação e aversão ao cor-
po gordo, causando impacto negativo diretamente na vida de pessoas obesas, tendo como alvo
principal as mulheres em nossa sociedade (Loureiro, 2017; Silva, 2017). McLaren (2016) acrescen-
ta que as mulheres estão sujeitas às práticas disciplinares associadas à “feminilidade normativa”,
que tentam regulá-las por meio do controle do peso, cirurgias plásticas e uso de maquiagem, por
exemplo. A autora ainda ressalta que esses estereótipos estéticos, que focam no “embelezamento
feminino”, advêm de um contexto patriarcal e são amplamente (re)produzidos na sociedade.
O “mito da beleza” dissemina histórica e socioculturalmente a ideia arbitrária de que a beleza seria
objetiva e universal, e as mulheres deveriam encarnar tal padrão estético ideal para atraírem os ho-
mens (isentos de tal obrigação estética) e, portanto, heteronormativo. Entretanto, a beleza constitui
um sistema monetário determinado pela política e por relações de poder, isto é, um conjunto de
crenças que atribui valores às mulheres de acordo com um padrão físico imposto socioculturalmen
-
te para manter o domínio masculino, além da submissão e da competição femininas (Wolf, 2020).
O
bullying
e a gordofobia são temas centrais apresentados nas cenas do filme, sendo marcantes nas
falas das participantes, a partir das provocações que as cenas do filme lhes causaram. Nessa perspec
-
tiva, as falas de Lorena e Laura convergem em suas narrativas ao criticarem os padrões normativos e
a gordofobia. Lorena enuncia: “em casa ela sofria bastante porque a mãe dela costurava v
ários vesti-
dos lindos e todos eram para pessoas super magras
”, “a mãe dela... sempre falando pra ela se vestir nos
padrões”, “Até o apelido que a mãe colocou nela de fofinha”, “Acabou sofrendo um pouco na escola, ela
sempre teve muito
bullying
”. Destacando a desaprovação que a mãe tinha com o corpo da filha, mes
-
mo que de forma velada. A mãe reitera preconceitos a partir de uma incessante cobrança, insatifação
e incômodo com a aparência da garota por não se encaixar nos padrões estéticos e não se interessar
em seguir a carreira de
miss
, apesar da jovem se sentir confortável com seu corpo. Tais atitudes da
mãe acabavam afetando sua autoestima, representando
uma situação vivenciada por muitas pes-
soas obesas. Para Silva (2017), o preconceito com a obesidade é uma construção sociocultural, pois
“ser gordo/a” tem sido foco de julgamentos ao longo da história.
O
bullying
sempre esteve presente na vida da personagem tanto por parte da sua mãe, quando
lhe apelidava de “fofinha”, como no ambiente escolar. Tais fatos impulsionaram a garota a deci
-
dir participar do concurso como forma de protestar contra a gordofobia. Esse apelido “fofinha”
faz alusão ao título do filme “Dumplin’”, que na tradução literal significa “bolinho”, pois ambos
remetem a pessoas gordas, que são moralmente julgadas e rejeitadas socialmente, ainda que
de modo sutil por meio de apelidos pejorativos, mas que são considerados “carinhosos e/ou
engraçados”. O preconceito sutil se apresenta de uma forma mais silenciada, velada ou disfar-
çada, expresso por meio de opiniões contrárias acerca de determinados grupos, sujeitos e/ou
assuntos (Lima; Vala, 2004). Reinert (2017) conceitua
bullying
como toda e qualquer atitude
agressiva (em geral, psicológica e/ou verbal), que cause dor e angústia, constituída por relações
de poder e que atua na (re)produção de estereótipos e desigualdades. Para a autora, a escola é
um dos espaços em que mais ocorrem esses tipos de conflitos por ser o palco de (des)encontro
das diferenças.
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10
Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
Laura destaca que a cena que lhe chamou atenção foi “quando Mily ganhou o concurso [...] porque
ela sempre teve esse sonho desde criança em participar desse concurso, só que por causa dos “pa-
drões” ela não participava dos concursos”.
Esse enunciado
nos mostra dois aspectos importantes.
Por um lado, a questão dos padrões normativos que limitam a vida de pessoas obesas, contribuin-
do para a disseminação de preconceitos como a gordofobia, que consiste na desvalorização de
pessoas gordas, constituindo uma discriminação a partir das relações de poder em vários contex-
tos socioculturais (Arraes, 2014). Por outro, mostra a possibilidade de romper normas, quando
as meninas desafiam a todos/as embarcando no concurso de
miss,
independentemente de serem
rotuladas como “gordas”. Para elas, um corpo gordo não limita a capacidade de participar de um
concurso e/ou de qualquer outra atividade. Dessa forma, vislumbraram no concurso uma opor-
tunidade de protestar e desconstruir preconceitos, dando visibilidade a corpos com identidades/
diferenças destoantes dos padrões hegemônicos, que sofrem exclusões nas passarelas, um dos
locais que mais (re)produzem representações estereotipadas de “corpo ideal”.
O filme também aborda a questão da (auto)aceitação, como denotam as participantes Kely e Eva
quando enunciam: “as pessoas não aceitavam o estilo de vida dela, o conforto que ela sentia com
o corpo [...] ficavam julgando-a, por ser mais gordinha, por não estar em forma, n
ã
o ser “bem feita
de corpo”; “a gente v
ê que tem muitas meninas que não se aceitam ou são julgadas por serem mais
gordinhas
”. Tais enunciados evidenciam o sofrimento e o constrangimento vivenciados diaria-
mente por pessoas gordas, pois costumam ser julgadas e excluídas, principalmente na escola por
destoarem dos “padrões ideais” impostos pela sociedade. Ser gordo/a representa um peso que vai
além do seu corpo, visto que, além de todo processo de (auto)aceitação, existe o assujeitamento
a uma gordofobia, que vai desde olhares externos tortos, julgamentos, críticas e exclusões que
geram inúmeros conflitos e inseguranças (Naumi; Sudo; Sudo, 2004).
Contudo, cabe questionar o que significa “bem feita de corpo”? Por que diferentes artefatos cul
-
turais e espaços sociais veiculam uma “boa forma feminina” a ser alcançada e desconsideram a
diversidade de corpos com belezas naturais? Embora seja uma resposta complexa, Wolf (2020,
p.80) questiona: “Quanto nós valemos? [...] O mito da beleza gera nas mulheres uma redução do
amor-próprio, com o resultado de altos lucros para as empresas.” Entretanto, a autora critica que
a aparência dos homens é avaliada de forma diferente, como se valessem mais sem precisar se
esforçar tanto, o que evidencia as relações de poder e outras questões socioculturais envolvidas
no “mito da beleza”.
A perspectiva pós-colonial possibilita a visibilização das vozes marginalizadas do Sul global ao
chamar atenção para as intersecções de raça-etnia, classe, sexualidade e gênero na construção
sociocultural de assimetrias nas relações de poder alicerçadas em oposições binárias Ocidente/
não Ocidente, civilizado/incivilizado, homem/mulher, branco/negro, cis/trans, heterossexual/ho-
mossexual, entre outras (Barasuol; Cerioli; Kalil, 2022). Seguindo o raciocínio de Foucault (2015),
a dimensão da sexualidade e do corpo costuma ser normatizada, portanto pessoas gordas LGB-
TQIA
9
+ são vistas como “anormais”, sendo alvo de preconceitos e exclusões por desviarem das
normas sociais regulatórias. Desse modo, torna-se importante desconstruir padrões e binarismos
que disseminam preconceitos sexuais, de gênero e estéticos.
O filme também faz uma crítica ao heteropatriarcado, quando as garotas usam o concurso como
uma forma de protesto e militância ao dar um grito de guerra contra o machismo estrutural, que
9
Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, Queer, Intersex, Agêneros e mais.
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“Todo mundo tem corpo de biquíni”
oprime e apaga a vida de milhares de mulheres. Nesse contexto, o heteropatriarcado pode ser
entendido como um sistema de opressão e conflitos relacionados à sexualidade, ocacionando
desigualdades de gênero que privilegia e hierarquiza o homem branco e heterossexual consti-
tuindo relações de poder, que estabelecem posições desiguais entre homens e mulheres (Pes-
soa, 2021).
Quadro 3 – Narrativas sobre a compreensão do termo patriarcado e sua relação com o feminismo
Ao chegar o dia da apresentação do ensaio uma das “garotas esquisitas” na sua apresentação é reprovada por apresentar
sua ideia revolucionária “hu hu há há, o patriarcado não passará!”. O que vocês entendem sobre esse termo patriarcado?
Qual a relação com o feminismo?
Pérola:
Eu acho que tem mais a ver com a “dominação masculina!” [...] é algo relacionado com a sociedade dominada por
homens, onde os homens ditam as regras [...].
Lorena:
Na forma dos homens dominarem as posições de liderança, seja na casa onde o pai é quem dita as regras, até
funções políticas e vários empregos, esse tipo de coisa. Eu acho que, patriarcado, eu definiria como um “mundo feito aos
olhos dos homens”, as regras feitas aos olhos do homem [...] é a forma de colocar as mulheres em posições inferiores na
vida. Eu acredito muito que isso tenha vindo do olhar do homem, que acabou impondo na sociedade e todo mundo come-
çou a seguir isso [...].
Melissa:
Os homens têm mais privilégio [...] tem uns que falam “ah, tu és mulher, tu não vais conseguir fazer isso” [...] “mas,
se fosse pra ser pedreiro vocês iam conseguir carregar sacos de cimentos e fazer todo trabalho pesado? [...] tem muito de
impor que os homens são mais fortes do que as mulheres.
Pérola:
É como se os meninos relacionassem nossa capacidade à
questão de força [...].
Melissa:
Tem vezes que você está cozinhando e, geralmente, chegam pessoas mais velhas e dizem “essa já está boa de
casar”, como se a mulher fosse obrigada a cozinhar para os homens.
Lorena:
E tem aquelas frases que diminuem muito a mulher, “ah você está parecendo uma mulherzinha”, se um homem
grita “parece uma mulherzinha”, se o homem chora “parece uma mulherzinha”. Tem todas essas questões “lugar de mulher
é na cozinha”, eu fico extremamente irritada com essas frases! A questão de o homem imaginar a mulher como “ser frágil”
não consegue associar a mulher com força. [...] e a maioria dos homens acaba achando que toda mulher é frágil, como se a
gente fosse incapaz de fazer tais coisas [...].
Laura:
Está muito presente na sociedade, a mulher ser tratada com inferioridade, ser mais fraca e não tem tanta capaci-
dade.
Mediadora: Vocês poderiam comentar a seguinte cena “é uma revolta contra o heteropatriarcado
que foi inconscientemente internalizado na mente humana”.
Pérola:
“Ela quis falar que o padrão que a sociedade impõe, não é bem as mulheres que colocam na sua mente, é como se
o homem influenciasse isso![...] Achei bem interessante ela levar o protesto para as passarelas, porque geralmente, nas
passarelas, é onde você vai ver aquele padrão, aquele corpo que as pessoas julgam ser ideal, o cabelo ideal, a forma que
as pessoas julgam que as mulheres devem de ser. Então, lá elas podem falar que todas as mulheres independente de corpo
e cabelo, de qualquer coisa, poderiam participar, não era uma coisa restrita a quem seguia o padrão.
Lorena:
Pelo menos, desde quando eu já nasci já existia esse padrão, que mulher e homem são gêneros totalmente dife-
rentes um do outro, que a mulher tem que ter a característica de “boa moça”, “ser bem educada”, “se vestir bem”, a mulher
tem que seguir todas as regras que colocaram, como ter um padrão de corpo X, se comportar de tal maneira [...].
Lorena:
[...] Assim, no início do filme quando elas começaram a planejar como executar esse protesto, eu imaginava que
era de outra forma, não desfilando [...] eu imaginei que fosse de uma forma escandalosa, e o protesto dela foi mostrando
que ela era capaz de fazer o que ela quisesse.
Laura:
[...] essa parte que ela falou tipo, em “criaram esses padrões”, eu acho que não foi uma mulher que foi lá e criou esse
padrão, basicamente foi o homem que foi lá e criou o padrão.
Fonte: Elaborado pela coautora a partir da entrevista coletiva em 18/09/2020.
Ao relacionar as cenas do filme com o conceito de patriarcado, as falas das participantes Lorena
e Pérola convergem ao destacar os termos “privilégio”, “dominação masculina”, “posições de lide-
ran
ça”, “o homem dita as regras”, “um mundo feito aos olhos do homem”,
em consonância com a ideia
de que o patriarcado é a “regra do pai”, evidenciando um dos marcadores socioculturais nessa
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Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
região do Cariri cearense, em que o machismo estrutural prevalece enraizado. Marques e Guerra
(2009, p. 01) definem o patriarcado como um “sistema de organização social, no qual as relações
entre o masculino e o feminino apresentam-se de forma hierarquizada e desigual resultando na
opressão e exploração das mulheres”.
Cabe problematizar o termo “dominação masculina” destacado na fala da participante, que, se-
gundo Bourdieu (2003), é considerado sinônimo de patriarcado. Para o autor, a “dominação ma-
sculina” constitui um “sistema de violências simbólicas, violência suave, insensível, e invisível às
suas próprias vítimas, que se exerce puramente pelas vias simbólicas da comunicação e do co-
nhecimento” (Bourdieu, 1998, p. 12).
Desse modo, a dominação masculina impõe e legitima o
masculino subordinando o feminino, criando um jogo de relações de poder que contribui para a
“domesticação dos dominados”.
Contudo, é imprescindível destacar os avanços para a equidade de gênero e as conquistas feministas
como forma de resistência, como, por exemplo, o direito ao voto, à educação, à proteção em casos
de violência doméstica, a aprovação da lei Maria da Penha, a conquista aos direitos reprodutivos e a
autonomia sobre seus corpos. No entanto, embora as lutas feministas tenham possibilitado o avanço
das conquistas das mulheres, a “cultura patriarcal” ainda prevalece na sociedade contemporânea,
marcando presença nos espaços educacionais. Fernandes e Mota (2008, p. 01) ressaltam que as dis-
cussões de gênero, feminismos e feminilidades precisam estar presentes nas escolas e em toda a
sociedade para mobilizar e desfazer valores e práticas sexistas que dão suporte a essa dominação
masculina e, assim, desestabilizar o patriarcado, construindo um mundo menos desigual.
Em países latino-americanos, como o Brasil, práticas socioculturais alicerçadas em um padrão
cisheteropatriarcal foram naturalizadas historicamente em decorrência da dominação colonial.
Assim, relações de poder que hierarquizam e invisibilizam identidades e diferenças destoantes
desse padrão marcam as dimensões de gênero e de sexualidade. Inclusive, no movimento feminis-
ta ocidental dominante, algumas vozes de mulheres (negras e trans) costumam ser invisibilizadas,
em contraponto urge a descolonização e a democratização dos feminismos, que visam (re)criar
alianças locais e globais, sobretudo para apoiar as lutas de mulheres e homens de diferentes co-
munidades de norte a sul do mundo (Stwart, 2017).
Além de o filme trazer uma crítica à questão do patriarcado, também chamou atenção durante
as entrevistas quando as participantes questionam a ideia arbitrária de força como sinônimo de
capacidade, como justificativa para uma suposta “fragilidade da mulher”, colocando-a em posições
de inferioridade. Os ditos de Melissa, Pérola e Laura convergem quando enunciam: “se fosse pra
ser pedreiro vocês iam conseguir carregar sacos de cimentos e fazer todo trabalho pesado?”; “eles
t
êm muito disso, de impor que os homens são mais fortes
”, “está muito presente na sociedade, a mu-
lher ser tratada com inferioridade, são mais fracas e não tem tanta capacidade”. Tais enunciados
representam uma suposta virilidade masculina, que reforça as desigualdades de gênero, sem levar
em conta os avanços científico-tecnológicos que modificaram formas de trabalho, que já não uti
-
lizam apenas a força física. Para Bourdieu (2003, p. 92) “a virilidade é uma noção eminentemente
relacional, construída diante dos homens para os homens contra a feminilidade, por uma espécie
de medo do feminino, e construída, primeiramente, dentro de si mesmo”. Nesse sentido, o autor
nos instiga a problematizar tal conceito quando questiona: “o que é a virilidade senão uma femi-
nilidade?” (Bourdieu, 2003 p. 106).
Vale enfatizar que somos submetidos/as à normatividade, que padroniza o universo masculino
como hegemônico, regulando a maneira como nos comportamos. Nesse rumo, o filme “Dum
-
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“Todo mundo tem corpo de biquíni”
plin’” sinaliza a desconstrução dessas normas regulatórias que regem socioculturalmente com
-
portamentos e binarismos naturalizados, regulando modos de ser menina/ser menino, sobre-
tudo ao vigiar corpos, comportamentos, vestimentas, constituindo o processo de construção de
identidades/diferenças por meio de vigilâncias e desigualdades de gênero como resquícios do
patriarcado.
Em “História da Sexualidade I”, Foucault discute sobre o conceito de biopolítica para problema-
tizar as vigilâncias e normas regulatórias que incidem sobre os corpos dos indivíduos em popu-
lação. Nesse sentido, Foucault (2015) entende biopolítica como um mecanismo, que, a partir do
século XVIII, tentou racionalizar os problemas postos à prática governamental pelos fenômenos
próprios a um conjunto de viventes constituídos em população: saúde, higiene, natalidade, longe-
vidade, raças...
Nesse contexto, “ser mulher” na sociedade, por vezes, significa se assujeitar a práticas machis
-
tas que costumam se manifestar de forma velada por meio de piadas e/ou expressões jocosas,
conforme Melissa e Lorena, quando ambas criticam termos pejorativos comuns do cotidiano, que
enaltecem o homem e diminuem a mulher ao enunciarem: “Tem vezes que você está cozinhando
e, geralmente, chegam pessoas mais velhas e dizem: “essa já está boa de casar”, como se a mulher
fosse obrigada a cozinhar para os homens”. Leia-se “bela, recatada e do lar”,
enunciado que costu-
ma ser muito repetido no cotidiano de muitas jovens, reforçando o pensamento essencialista de
que as mulheres seriam designadas ao casamento e à maternidade, enquanto a vida pública e o
trabalho seriam o destino dos homens.
Em contrapartida, os feminismos ampliam as possibilidades, escolhas e liberdades das mulheres,
desconstruindo essa relação direta com a maternidade e o espaço doméstico
.
Dávila (2019, p. 26)
nos lembra de que o feminismo “é também, liberdade de existirmos neste mundo e sermos felizes
sem nos tornarmos mães, sobre pararem de vender a ideia de plenitude e vitória vinculada à ma-
ternidade e ao casamento”. Desse modo, torna-se necessário desnaturalizar a ideia que a mulher
só “serve para o mundo, se exercer a maternidade”.
Nesse contexto, a participante Lorena ainda complementa “ah voc
ê está parecendo uma mulher-
zinha”, “se o homem chora parece uma mulherzinha”, “lugar de mulher é na cozinha”, “imaginar a
mulher como “ser frágil,
reforçando a ideia machista construída socioculturalmente, da mulher
vista como “sexo frágil”. É muito comum nos deparamos com esses enunciados repetidos e natura-
lizados no cotidiano e nas redes sociais. O complemento de tais enunciados vem acompanhado de
opiniões machistas na tentativa de manter o patriarcado e diminuir as mulheres nos diferentes es-
paços sociais, principalmente nas escolas. Louro (2017, p. 67) nos alerta que termos como “viado”,
“criolo”, “bicha”, “sapatão” e, acrescentamos, “maricas”, “mulherzinha”, entre outros, não são ex-
pressões inocentes, visto que produzem efeitos e machucam, deixando marcas profundas na vida
dos sujeitos. Bento (2016) complementa que a aproximação do universo feminino (por travestis,
mulheres transexuais, gays femininos e meninos afeminados) leva à percepção do feminino como
abjeto, inferiorizado. Desse modo, Dávila (2019, p. 68) questiona: “Você deixou de achar graça de
alguma piada porque se colocou no lugar daquela mulher?”.
Ao comentarem a cena do filme sobre a “revolta do heteropatriarcado”, as falas das participantes
Pérola, Lorena e Melissa convergem quando destacam “padr
ões impostos
”, “caracter
ísticas de
boa
moça”, “ser bem educada”, “bem comportada”, “ter o corpo ideal”, “corpo perfeito”, tais enunciados
representam uma feminilidade hegemônica imposta aos padrões normativos. O corpo feminino
passa incessantemente por olhares e julgamentos negativos, assujeitando as mulheres a experi-
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Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
mentar a distância do “corpo real” e o “corpo ideal”, além de restringir e vigiar o comportamento
feminino ditando maneiras e regras para “ser feminina” (Bourdieu, 2003).
Nessa direção, a cena do filme em que as mulheres usam o desfile para fazer um protesto
pro-
blematiza o padrão hegemônico de feminilidade, buscando liberdade de vivenciar as múltiplas
feminilidades, mostrando que é possível ser feliz e se aceitar sem se enquadrar em padrões nor-
mativos. Quando Lorena ressalta: “Eu imaginei que o protesto fosse de uma forma escandalosa e
o protesto dela foi mostrando que ela era capaz de fazer o que ela quisesse”,
sinaliza que as repre-
sentações acerca dos movimentos feministas são marcadas por pré-julgamentos e pela ideia de
radicalismo. Entretanto, os feminismos constituem uma incessante luta pela equidade e diversi-
dade de feminilidades (e também masculinidades), desconstruindo tabus de um “corpo ideal”, que
reforçam a dominação masculina ao atribuírem uma imagem da mulher como objeto simbólico,
a partir de uma noção equivocada de “ser feminina”, com adjetivos como atraentes, sorridentes,
atenciosas e discretas. Assim, a feminilidade constituiria um corpo sexualizado (Bourdieu, 2003).
Esse filme incentiva a desconstrução do patriarcado e dos padrões normativos quando as partici
-
pantes Pérola e Melissa relacionam o desfile como protesto ao destacarem que:
“ela quis dizer que
com o protesto não se deve impor padrões, tipo ter um corpo perfeito para a sociedade”; “Achei
bem interessante ela levar o protesto para as passarelas, porque geralmente nas passarelas é onde
voc
ê vai ver aquele padrão, aquele corpo que as pessoas julgam ser ideal, a forma que as pessoas
julgam que as mulheres devem ser”.
Os desfiles deixam marcas culturais e reflexos na sociedade,
pois as passarelas influenciam a vida de muitas pessoas, visto que a subordinação dos “corpos
ideais” reafirma que vivemos em uma era que tenta impor aos corpos parâmetros e molduras, que
passam a ser o objetivo dos/as jovens que buscam a todo custo alcançar o “sonhado” corpo escul-
tural estampado nas passarelas, nas mídias televisivas e nas redes sociais, constituindo um corpo
“biocultural” (Sanches, 2009).
Por outro lado, embora o corpo magro continue sendo o foco de influência nas passarelas, os con
-
cursos de
miss
começaram a incluir e dar visibilidade a uma diversidade de corpos, possibilitando
o reconhecimento de múltiplas feminilidades. Cabe destacar o Miss Ceará 2018
10
, que incluiu a
categoria
plus size
como uma modalidade do desfile, atingindo uma marca histórica, que além de
representar e enaltecer a beleza da mulher gorda, resgata a autoestima e o respeito, reconhecendo
as diferenças e abrindo espaço para a diversidade e a desconstrução de preconceitos. Entretanto,
torna-se importante problematizar as representações estereotipadas acerca dos corpos e identi-
dades femininas que, histórica e socioculturalmente, constituem os concursos de
miss
, assim como
a inclusão da categoria
plus size,
uma vez que, de modo sutil ou manifesto, ainda ditam padrões es-
téticos que categorizam e excluem distintos corpos, feminilidades e identidades/diferenças. Além
disso, ainda que essa categoria seja incluída, pode engendrar padrões normativos também para o
corpo gordo.
Nesse olhar, a gordofobia não costuma ser reconhecida como preconceito, pois, muitas vezes, vem
camuflada por meio de uma preocupação com a saúde da pessoa e/ou mascarada na forma de
supostos “elogios”: “você tem o rosto tão bonito, por que não emagrece?”. Loureiro (2017) salienta
que essas frases pejorativas são carregadas de preconceitos e intolerância. Dessa forma, torna-se
necessário discutir sobre feminismos e feminilidades no contexto escolar para desconstruir tais
10
Disponível em: https://tvnordestevip.com/candidatas-a-miss-plus-size-ceara-2020-serao-apresentadas-em-um-coque-
tel-no-hotel-sonata-de-iracema Acesso em 20 dez. 2020.
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“Todo mundo tem corpo de biquíni”
preconceitos e binarismos que hierarquizam as relações de gênero e propagam desigualdades
nas vivências de identidades/diferenças, afetando sobretudo as meninas/jovens/mulheres/LGB-
TQIA+.
4. Todo mundo tem um “corpo de biquíni”: problematizando (pre)conceitos
Quem nunca se sentiu incomodada ao ir à praia/piscina e colocar um biquíni? Já pararam para
pensar o porquê e os discursos que enaltecem esse cenário? O filme nos impulsiona a refletir
sobre esses questionamentos quando traz uma crítica ao padrão hegemônico de feminilidade. As-
sim, o longa-metragem, ao narrar o “drama de ser gorda” vivido pela personagem principal, re-
presenta uma situação vivenciada por muitas mulheres invisibilizadas e excluídas, sobretudo nos
espaços educacionais. Ao abordar a questão da gordofobia em forma de protesto, o filme ressalta a
representatividade das múltiplas feminilidades e dos feminismos por meio dos artefatos culturais.
O quadro 4 apresenta a discussão sobre “todo mundo tem um corpo de biquíni”.
Quadro 4 – Debate sobre o tema “todo mundo tem corpo de biquíni”
Ao iniciar o desfile com o tema “estilo de vida fitness”, Wil e Elen preparam uma surpresa para o público e repassam a
mensagem “todo mundo tem corpo de biquíni” para o público. Vocês poderiam comentar sobre essa cena?
Melissa:
Elas passaram realmente a mensagem do protesto delas. Porque as pessoas têm preconceitos com as mais
gordinhas e que têm estrias. Ficam falando para não usar biquíni, porque o corpo é feio e tal [...], mas, com essa frase,
elas quiseram mostrar o oposto, que todo mundo pode usar biquíni e se sentir confortável com o corpo que tem.
Lorena:
É uma questão que eu vejo muito no dia a dia, em qualquer lugar vejo as pessoas sofrendo preconceito por
serem gordas, é uma questão de o que as pessoas acham bonito de se ver. Eu tenho certeza que se uma criança crescesse
com pessoas que não julgassem as pessoas gordas, elas não iriam julgar pessoas gordas se elas usassem biquíni ou não.
As pessoas colocam um padrão, que o bonito é ser magro, mas “ter corpo”, as pessoas crescem acreditando que aquilo
é o que é o mais bonito de se ver, e quando veem corpo de pessoas diferentes, seja deficiente, gordo, ou mais magro
do que o padrão, as pessoas não acham bonito de se ver e acabam criticando. Eu já vi pessoas de biquíni na praia e as
pessoas rirem [...].
Melissa:
Um dia desses tinha passado uma mulher gordinha com um short curto, aí minha madrinha disse: “olha que
coisa horrível uma mulher gorda com um short
curto”, aí eu disse: “o que é que tem?” Aí ela disse:
é “muito feio uma
mulher gordinha de
short curto, é por isso que eu não uso”. É como se ela não se sentisse à vontade com o corpo que tem.
Fonte: Elaborado pela coautora a partir da entrevista coletiva em 18/09/2020.
Ao comentarem a cena do desfile com o tema “estilo de vida fitness”, quando Wil e Elen passam
a mensagem “todo mundo tem corpo de biquíni”, as falas de Melissa e Lorena, respectivamente,
convergem ao destacarem a questão do preconceito e a gordofobia quando enunciam “as pessoas
têm preconceitos com as mais gordinhas e que têm estrias. Ficam falando para não usar biqu
íni,
porque o corpo é feio e tal”,
“em qualquer lugar vejo as pessoas sofrendo preconceito por serem
gordas”; “eu j
á vi pessoas de biquíni na praia e as pessoas rirem
”. Tais enunciados costumam ser
repetidos corriqueiramente nas vivências de pessoas gordas e/ou obesas, representando, além da
gordofobia, outros preconceitos e discriminações expressos por meio da exclusão e negação des-
sas mulheres em distintos espaços socioeducacionais, afetando diretamente a autoestima, visto
que a todo o momento estão sendo julgadas,
seja por meio de atitudes negativas, seja por “brinca-
deiras”, marcando e assujeitando suas vidas.
Dávila (2019, p. 80) nos convida a pensar, por meio de um exercício mental, quando questiona
“quantas mulheres você vê com o corpo coberto na praia? Quantas se submetem a cirurgias plás-
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16
Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
ticas?” Agora você já observou essa mesma situação em relação aos homens? Talvez, esse episódio
esteja relacionado à pressão psicológica da mídia que influencia sistemática e continuamente as
mulheres a se encaixarem em padrões de beleza e juventude. A mídia como pedagogia cultural é
uma das responsáveis por disseminar padrões normativos, que ensinam, por meio de artefatos
culturais, como os sujeitos devem ser e se comportar socialmente, disseminando padrões norma-
tivos, que estabelecem “modelos de beleza”, nos quais, na maioria das vezes, os corpos considera-
dos bonitos são os jovens e magros. Nessa lógica, o corpo gordo que destoa desse padrão é discri-
minado e estigmatizado, além de ser associado às doenças e à obesidade (Costa; Silveira; Sommer,
2003; Stenzel; Guareschi, 2002).
Embora existam artefatos midiáticos que começaram a dar visibilidade a uma diversidade de cor-
pos e feminilidades, a maioria dos filmes e propagandas televisivas ainda enfatiza o corpo magro
como “corpo ideal” e/ou “corpo de verão”. Wolf (2020) analisa o papel das mídias sociais nos
avanços obtidos ao tentar pluralizar os ideais de beleza e dar visibilidade a corpos até então dis-
tantes do reconhecimento e dos meios de comunicação. A autora sinaliza a necessidade de pro-
blematização acerca da representação e da representatividade de corpos na mídias sociais, pois,
por um lado, podem intensificar a pressão e insegurança de jovens acerca de sua aparência física,
por outro, possibilitam derrubar a barreira entre os/as consumidores/as e os/as produtores/as
da mídia.
A participante Lorena ressalta: “Eu tenho certeza que se uma criança crescesse com pessoas que não
julgassem as pessoas gordas, elas não iriam julgar pessoas gordas se elas usassem biquíni ou não [...]
Quando veem corpos de pessoas diferentes, seja gordo, seja mais magro do que o padrão as pessoas
acabam criticando”. Sua fala evidencia que o preconceito é construído culturalmente, uma vez que
a beleza está diretamente associada a corpos magros e a sociedade moderna critica gorduras, con-
dicionando a ideia de que corpos “bem definidos”, “corpos de verão”, são os mais desejados, ou seja,
a cultura constitui corpos objetificados, sexualizados, padronizados e docilizados. Dessa forma, as
questões estéticas também passam a ser causas feministas, pois têm um sentido de legitimação da
opressão na sociedade, visto que a forma que as instâncias sociais oprimem os corpos constitui um
mecanismo que os impossibilita ocupar os espaços públicos, pois a autoestima abalada pode provo-
car depressão e autoexclusão dos espaços públicos e privados (Dávila, 2019).
Para Louro (2017, p. 56), feminismos e feminilidades (bem como as masculinidades) se fazem,
portanto, por meio de repetição, atos, gestos e modos; ou seja, de uma “estilização dos corpos”.
O filme “Dumplin’” ainda nos lembra que a gordofobia e os demais preconceitos acerca das femi
-
nilidades estão presentes em todos os lugares, principalmente nos espaços escolares, ainda que
de forma sutil, por meio de atitudes, gestos e olhares que muitas vezes passam despercebidos e,
justamente por isso, precisam ser combatidos diariamente. Então, por que não começarmos no
contexto escolar?
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17
“Todo mundo tem corpo de biquíni”
Quadro 5 – (Re)conhecimento de preconceitos e gordofobia
Você já presenciou alguma cena de preconceito envolvendo a questão da gordofobia?
Lorena: Muitas vezes, quando eu ia fazer alguma coisa com um/a amigo/a que fosse gordo/a, quando eu
estava com outras pessoas, eles criticavam na minha frente dizendo “ai, mas fulano é gordo”. Eu ficava com
uma interrogação no meio da minha testa. O que é que tem a ver fulano ser gordo com a capacidade? Com
competência? Tem muita aquela relação com a higiene, que falam “ai, fulano é gordo não se cuida, tem
pizza debaixo do braço, sua demais”. Eu fico extremamente irritada [...].
Melissa: Com Poliana mesmo, já vi gente dizendo “ela é tão gente boa, mas é tão cheinha”. Como se tivesse
alguma coisa a ver (o fato de ser gorda).
Lorena: Essas pessoas que criticam as outras por elas serem de tal maneira são as mais “frustradas” com
seus próprios corpos e acabam não se aceitando como são. [...] Se você faz coisas que você gosta, se você é
feliz consigo mesmo, as pessoas vão se incomodar, porque muitas delas são frustradas [...] Aquela questão
do homem hetero odiar que uma mulher seja capaz de fazer uma coisa melhor que eles. Geralmente,
quando estão em uma conversa que uma mulher tenha mais conhecimento sobre tal assunto, eles tentam
de alguma forma contornar todo o assunto, é como se a opinião dela e o conhecimento não valessem a
pena, porque ela é mulher. Eu já vivi isso várias vezes, quando estou em debate que os caras têm isso
em mente, sempre tentam diminuir o meu conhecimento de alguma forma! Desde assuntos escolares de
alguma matéria, ou algum assunto social, como racismo, gordofobia, eles começam me destratar e acabam
me excluindo da conversa, como se eles se sentissem ameaçados. Eu já percebi, geralmente, é mais sobre
essas questões do feminismo. [...] Muitas vezes essas pessoas são tóxicas, tentam lhe diminuir de qualquer
maneira.
Fonte: Elaborado pela coautora a partir da entrevista coletiva em 18/09/2020.
O longa-metragem provoca problematizações acerca da gordofobia, da autoestima, do empodera-
mento feminino e da empatia, sinalizando a ideia de desconstruir estereótipos de beleza e padrões
alicerçados no patriarcado. Ao relacionar a gordofobia com feminismos e feminilidades no con-
texto escolar, as falas de Lorena e Melissa convergem quando criticam enunciados depreciativos:
“ai, fulano
é gordo não se cuida, tem pizza debaixo do braço, sua demais”; “ela é tão gente boa, mas
é tão cheinha”, como se o fato dela ser cheinha fosse algum defeito
. Tais enunciados sinalizam a pro-
blematização de preconceitos e discriminações com pessoas gordas que caracteriza a gordofobia.
Vale enfatizar que muitas pessoas usam a gordofobia como forma de rotular o feminismo, dissemi-
nando a ideia deturpada que as feministas “são infelizes com seus corpos imperfeitos”, “são todas
gordas”, “não se depilam”, atribuindo um valor negativo à palavra feminista na tentativa de manter
o machismo e o patriarcado intactos. Todavia, “o feminismo soa como uma palavra de honra”, pois
luta pela liberdade das mulheres em todas as dimensões, enfrentando o racismo e a gordofobia
disfarçados de plaquinhas de boa aparência nas ofertas de emprego (Dávila, 2019).
Os discursos normativos permeiam as questões de gênero, feminismos e feminilidades, se fazendo
presentes nos artefatos culturais e pairando sobre as vivências estudantis, narradas pelas parti-
cipantes, quando destacam que a gordofobia e o heteropatriarcado invisibilizam as mulheres nos
espaços socioeducacionais. Nessa perspectiva, Lorena critica o heteropatriarcado ao destacar “a
quest
ão do homem hetero odiar que uma mulher seja capaz de fazer uma coisa melhor que eles [...]”,
tal enunciado incita o questionamento de machismos e misoginias que oprimem e silenciam as
mulheres em distintos espaços socioeducacionais.
Dávila (2019, p. 139) ressalta que a “misoginia é o ódio, aversão, e o desprezo contra as mulheres”.
Vale enfatizar que a misoginia é produto de uma cultura machista e patriarcal, que propaga desi-
gualdades de gênero na sociedade contemporânea. Torna-se necessário que as escolas promovam
uma educação sem machismos e incorporem os feminismos e feminilidades no contexto educacional
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18
Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
para propagar empatia e sororidade, bem como para formar homens que valorizem e respeitem as
mulheres para desconstruir as desigualdades e, enfim, alcançarmos a equidade entre os gêneros.
Ao destacar a questão do machismo nas suas vivências pessoais e estudantis, Lorena ainda com-
plementa:
Eu já vivi isso várias vezes, quando estou em debate os caras, sempre tentam diminuir
o meu conhecimento de alguma forma! Desde assuntos escolares de alguma matéria, ou
algum assunto social, como racismo, gordofobia, eles começam me destratar e acabam me
excluindo da conversa, como se eles se sentissem ameaçados. Eu já percebi, geralmente, é
mais sobre essas questões do feminismo
.
Tais ditos sinalizam a prática de
mansplaining
, ou seja, atitudes machistas que tentam silenciar e
apagar as vozes das mulheres em todos os aspectos.
Dávila (2019) salienta que o termo
mansplaining
significa “homem explicando”, ou seja, quando
uma mulher entende e fala sobre algum assunto, sempre tem um homem para explicá-lo nova-
mente e deixar explícito que “sabe mais” do assunto, muitas vezes, até mesmo sem entender de
fato, na tentativa de silenciar as mulheres em distintos espaços: institucionais, sociais e escolares.
Nesse contexto, é importante problematizar a questão do silenciamento das mulheres, pois cons-
titui uma prática machista muito comum em nosso cotidiano, principalmente nas escolas.
O machismo e o sexismo parecem enraizados nos contextos educacionais, posto que silenciam e
invisibilizam a figura feminina por meio da exclusão das mulheres de profissões, carreira, discipli
-
na, gerando posições hierárquicas desiguais. Desse modo, torna-se necessário desenvolver políti-
cas públicas que levem em consideração os efeitos negativos provocados pela dominação masculi-
na, criando parcerias entre as escolas e as famílias, visando desconstruir preconceitos, machismos
e práticas sexistas para o desaparecimento progressivo da dominação masculina, mesmo que em
longo prazo (Bourdieu, 2003).
O filme engloba a questão da gordofobia, no entanto, ao relacionar com o contexto escolar pode
-
mos destacar inúmeros outros preconceitos associados a distintos marcadores identitários, como,
por exemplos, a invisibilização das mulheres nas ciências, práticas sexistas e misóginas nos inter-
valos e salas de aula, assimetrias de gênero nos relacionamentos afetivos, pré-julgamentos com
relação à sexualidade feminina, entre outros. Dessa forma, enfatizamos a necessidade da incorpo-
ração de feminismos nos currículos escolares para possibilitar o exercício de problematização e
desconstrução de preconceitos alicerçados no patriarcado, instigando o empoderamento femini-
no, a sororidade e a construção de um mundo mais filógino.
Conclusões transitórias
No decorrer desta pesquisa, evidenciamos os limites e as possibilidades nos modos de incorpo-
ração (ou não) dos feminismos e das feminilidades nos currículos escolares, a partir da análise
do discurso, por meio da problematização de artefatos culturais, nesse caso, o filme “Dumplin’”,
relacionando-o com as narrativas/vivências estudantis. Cabe salientar que algumas discentes des-
tacaram a carência formativa dessa temática nas escolas, e, acrescentamos, na universidade, talvez
devido à forte influência histórica e sociocultural do patriarcado aliado ao machismo na dissemi
-
nação de misoginias e práticas sexistas, além disso, o fundamentalismo religioso constitui um dos
principais empecilhos no interior do Cariri cearense.
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19
“Todo mundo tem corpo de biquíni”
Os padrões normativos, os machismos, as misoginias e as práticas sexistas constituem cenas marcan-
tes na escola, conforme foi relatado nesta pesquisa. Nesse sentido, estão entre as principais demandas
educacionais contemporâneas, pois abrigam múltiplas representações estereotipadas acerca das femi-
nilidades (e das masculinidades), ocasionando desigualdades de gênero que atravessam os distintos
cenários educacionais. As violências físicas e verbais, preconceitos,
bullying
e gordofobia também são
fatores que foram destacados nos relatos e vivências das discentes, o que torna esse cenário ainda mais
agravante, visto que os casos de depressão e suicídios entre jovens são alarmantes na sociedade.
Dessa forma, torna-se urgente e necessário implementar políticas públicas para amparar as jovens
mulheres contra violências de gênero. Um caminho produtivo seria a incorporação das temáticas
de gênero, corpo, sexualidade, feminismos e feminilidades nos currículos escolares e acadêmicos,
para que possamos resgatar vidas, autoestimas e autoaceitação por meio da educação, além de
reconhecer as identidades/diferenças e as múltiplas feminilidades (e também masculinidades).
Assim, vislumbramos novos horizontes para ir além dos padrões hegemônicos, buscando plurali-
zar os sentidos, os saberes e as práticas nos currículos escolares. Quem sabe o feminismo não seria
um ponto de partida para derrubar as barreiras e ultrapassar as fronteiras de gênero?
Desse modo, concluímos que a partir da problematização de discursos e artefatos culturais, como o
filme “Dumplin’”, relacionados com as temáticas de feminismos e feminilidades, incentivamos as jovens
estudantes a desenvolverem um olhar crítico acerca de práticas machistas e padrões misóginos que
cercam o nosso cotidiano e privam as mulheres de terem autonomia sobre seus corpos e suas vidas,
além de impedi-las ou dificultar sua emancipação social, emocional e política. Assim, esta pesquisa con
-
tribuiu também para instigar o interesse das estudantes sobre as questões de gênero, feminismos, fe-
minilidades e preconceitos, como a gordofobia. Uma vez que, nos espaços escolares, não costumam ser
discutidas de modo contínuo e sistemático, ainda que os machismos estejam explícitos nas vivências
estudantis. Então, meninas/jovens/mulheres (estudantes, educadores/as) precisamos ampliar as lutas
feministas nas escolas e demais espaços socioeducativos para que nossos corpos com múltiplas identi-
dades/diferenças sigam livres, plurais e “(im)perfeitos”. Afinal, todas nós temos um “corpo de biquíni”!!!
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Elaine de Jesus Souza; Eugerbia Paula da Rocha; Claudiene Santos
“Everybody has a bikini body”:
problematizing fatphobia and
femininity patterns from the film
Dumplin (2018)
Abstract:
In this study, we analyze discourses on youth fe-
minisms and femininities in the school context of
Cariri, in Ceará, Brazil, based on the problematiza-
tion of cultural artifacts. The research involved 13
young women students from state public schools,
through a press conference, with Foucault’s dis
-
course analysis to examine the empirical material.
The results obtained showed that juvenile femini-
nities aremarked by stereotyped normative pat-
terns, bullying, violence and prejudices such as fa-
tphobia, as well as the non-recognition of multiple
femininities. Thus, we conclude by emphasizing
the importance of incorporating the debate on fe-
minisms and femininities in school and academic
curricula.
Keywords:
Femininities. Feminisms. Gender. Fat-
phobia. Movie theater.
“Todo el mundo tiene cuerpo de biquini”:
problematizando la gordofobia y los
patrones de feminidad a partir de la
película “Dumplin’” (2018)
Resumen:
En este estudio, analizamos discursos sobre fe-
minismos y feminidades juveniles en el contexto
escolar del Cariri, en Ceará, Brasil, a partir de la
problematización de artefactos culturales. La in-
vestigación involucró a 13 jóvenes estudiantes de
escuelas públicas estatales, a través de una entre-
vista colectiva, con el análisis del discurso de Fou-
cault para examinar el material empírico. Los re-
sultados obtenidos mostraron que las feminidades
juveniles están marcadas por patrones normativos
estereotipados,
bullying
, violencia y prejuicios
como la gordofobia, así como el no reconocimien-
to de las feminidades múltiples. Así, concluimos
destacando la importancia de incorporar el debate
sobre feminismos y feminidades en los currículos
escolares y académicos.
Palabras clave
: Feminidades. Feminismos. Géne-
ro. Gordofobia. Cine.
HISTÓRICO
Recebido: Outubro/22
Parecer: Abril/23
Parecer: Março/23
Aceito: Abril/23
Revisado Autor: Abril/23
Revisão Gramatical/Ortográfica e ABNT: Junho/23
Revisado Autor: Junho/23
Diagramação: Junho/23
Publicado: Junho/23
Equipe Editorial Revista TOMO envolvida no processo editorial deste artigo
Marina de Souza Sartore (Editora-Chefe)
Fabiana Bartira de Souza Brito (Editora assistente júnior)