POLÍTICAS DO SEGREDO: INCURSÕES ETNOGRÁFICAS NO CAMPO DA (I)LEGALIDADE FISCAL
DOI:
https://doi.org/10.21665/2318-3888.v6n12p19-46Resumo
O objetivo deste artigo é abordar as “políticas do segredo”, intrínsecas ao funcionamento do Estado, por meio do enfoque de atos do Estado implementados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, a partir de diferentes visadas em relação à instituição, que colocam em evidência perspectivas diferentes de aproximações de um mesmo objeto. No primeiro caso trata-se de analisar, antropologicamente e de um ponto de vista institucional, a importância atribuída ao sigilo fiscal como representação oficial ambígua que perpassa e regula as relações sociais vivenciadas na Receita Federal, permeando a reflexão e a experiência no Estado internamente. No segundo, o enfoque etnográfico recai nos modos como é vivenciado o poder regulador do Estado brasileiro na fronteira geopolítica situada em Foz do Iguaçu, da perspectiva dos chamados “sacoleiros” e “atravessadores”, com base em práticas cotidianas não oficiais que vão de encontro às normas fiscais reguladoras, com pessoas envolvidas em circunstâncias de segredo e ilegalidade. Nos dois casos, os pressupostos comuns que associam noções como sigilo e legalidade, fronteiras e margens do Estado são problematizados pelos conceitos que orientam as duas reflexões etnográficas em diálogo, “de dentro” ou “de fora” do Estado. Os significados dessas noções são intercambiáveis e flexíveis, verso e reverso de uma conformação estatal específica, em configurações passíveis de serem analisadas em diálogo por se constituírem como efeitos de um mesmo Estado-Nação atuante na administração tributária e na fiscalização das fronteiras em todo o território nacional.Downloads
Referências
AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer: o poder soberano e a vida nua I. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.
ALBUQUERQUE, J. L. E PAIVA, L. F. S. Entre nações e legislações: algumas práticas de “legalidade” e “ilegalidade” na tríplice fronteira amazônica (Brasil, Colômbia e Peru). Revista Ambivalências, v.3 , n.5 , p. 115-148, jan-jun. 2015.
BALANDIER, Georges. Antropologia política. Lisboa, Editorial Presença, 1987.
BEVILAQUA, Ciméa B. Se esconder o leão pega, se mostrar o leão come: um estudo antropológico do Imposto de Renda. 1995. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) -UFPR, Curitiba, 1995.
BOBBIO, Norberto. Democracia e segredo. São Paulo: Editora Unesp, 2015.
BOURDIEU, Pierre. Sobre o Estado. Curso no College de France (1989-92). São Paulo: Companhia das Letras, 2014.
BRASIL. Decreto-lei 1.713, de 28 de outubro de 1939, art. 224 e 225, ou a Lei 1711, de 28 de outubro de 1952, art. 207. Dispõe sobre o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-lei/1937-1946/Del1713.htm Acesso em: 24 nov. 2018.
_____. LEI Nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm. Acesso em: 24 nov.2018.
_____. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 24 nov.2018.
_____. Ministério da Fazenda. Combate ao contrabando e descaminho. Disponível em: http://idg.receita.fazenda.gov.br/sobre/acoes-e-programas/combate-a-ilicitos/contrabando-e-descaminho. Acesso em: 24 de nov. 2018.
CANETTI, Elias. Massa e poder. São Paulo: Cia das Letras, 2005.
CARDIN, Eric G. Laranjas e sacoleiros na tríplice fronteira: um estudo da precarização do trabalho no capitalismo contemporâneo. Cascavel: EDUNIOESTE, 2011.
_____. A expansão do capital e as dinâmicas das fronteiras. Jundiaí (SP): Paco Editorial, 2015.
CARVALHO, José J. A racionalidade antropológica em face do segredo. Anuário Antropológico/84. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1985
DAS, Veena, e POOLE, Deborah (Orgs). El estado y sus márgenes. Etnografias comparadas. Cuadernos de Antropologia Social, n. 27. Buenos Aires: FFyL/UBA, 2009.
DONNAN, H. T. M.Wilson. Borders: frontiers of identity. Nation and State. Oxford/New Work: Berg, 1999.
DORFMAN, Adriana. A cultura do contrabando e a fronteira como lugar de memória. Estudios históricos, n.1 – CDHRP- mai. 2009.
FIOROTTI, Cíntia. Os descaminhos na fronteira: fiscais do estado e trabalhadores nos processos de apreensão de mercadorias na fronteira Brasil-Paraguai (1980- 2015). Revista Ambivalências. v.3. n.5 p. 85-114. jan-jun. 2015.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis, RJ: Vozes, 1984.
JONES, Graham M. Secrecy. Annual Review of Anthropology. v.43 p. 53-69, jun. 2014.
LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1994.
MACAGNO, Lorenzo; MONTENEGRO, Silvia; BELIVEAU, Verónica Giménez. A tríplice fronteira: espaços nacionais e dinâmicas locais. Curitiba: UFPR, 2011.
MIRANDA, Ana Paula M. Fisco e Cartórios: exemplos de burocracia à brasileira. In: SOUZA LIMA, Antonio C. Antropologia e Direito: temas antropológicos para estudos jurídicos. Rio de Janeiro/Brasília:ABA/LACED/Contracapa, 2012.
_____. Burocracia e fiscalidade. Uma análise das práticas de fiscalização e cobrança de impostos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015.
MISSE, Michel. Trocas ilícitas e mercadorias políticas: para uma interpretação de trocas ilícitas e moralmente reprováveis cuja persistência e abrangência no Brasil nos causam incômodos também teóricos. Anuário Antropológico [Online], II | 2010, online no dia 30 outubro de 2015. Disponível em: http://journals.openedition.org/aa/916 DOI : 10.4000/aa.916. Acesso em: 29 set. 2018.
NEVES, Alex Jorge et al. (Org.) Segurança pública nas fronteiras, diagnóstico socioeconômico e demográfico: Estratégia Nacional de Segurança Pública nas Fronteiras (ENAFRON) Brasília: Ministério da Justiça e Cidadania, Secretaria Nacional de Segurança Pública, 2016.
PEIRANO, Mariza. A teoria vivida e outros ensaios de antropologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006.
PETRY, Rodrigo C. “O sigilo bancário e a fiscalização tributária”. Revista Dialética de Direito Tributário (RDDT), São Paulo, n. 190, 2011.
PINHEIRO MACHADO, Rosana. Made in China: Produção e circulação de mercadorias no circuito China- Paraguai-Brasil”. 2009. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2009. Disponível em: http://pct.capes.gov.br/teses/2009/42001013034P0/TES.PDF. Acesso em 12 de nov. 2018.
_____. Casinos del contrabando: la fiscalización en el Puente de la Amistad y sus efectos en la cotidianeidad de la Tríplice Fronteira. In:
MONTENEGRO, Silvia, y Verónica GIMÉNEZ BÉLIVEAU. La triple frontera: globalización y construccion social del espacio. Buenos Aires: Miño y Dávila, 2006.
PIZOLIO, Reinaldo e CAVALDÃO JR., Jayr V. (Coord.) Sigilo fiscal e bancário. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
RABOSSI, Fernando. Como pensamos a tríplice fronteira?. In: MACAGNO, Lorenzo, MONTENEGRO, Silvia y BÉLIVAU, Verónica Giménez (Orgs.). A tríplice fronteira: espaços nacionais e dinâmicas locais. Curitiba: Editora UFPR, 2011, p. 39-61.
RABOSSI, Fernando. Nas ruas de Ciudad del Este: vidas e vendas num mercado de fronteira. 2004. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Programa de Pós-graduação em Antropologia Social, Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2004. Disponível em: http://objdig.ufrj.br/72/teses/FernandoRabossi.pdf. Acesso em: 12 nov. 2018.
RENOLDI, Brígida. Estados posibles: travesías, ilegalismos y controles en la Triple Frontera. Etnográfica [Online], v. 19, n. 3, 27 out. 2015. Disponível em: http:// etnografica.revues.org/4049. Acesso em: 28 out. 2015.
ROITMAN, Janet. The ethics of illegality in the chad basin. In: COMAROFF, Jean; COMAROFF, John. (Dirs). Law and Disorder in the Postcolony. University of Chicago Press, 2006. Disponível em: http://isites.harvard.edu/fs/docs/icb.topic1286816.files/The Ethics of Illegality.pdf . Acesso em: 12 nov. 2018.
_____. A successful life in the illegal realm: smugglers and road bandits in the Chad Basin". In: GESCHIERE, P.; MEYER, B.; PELS, P., (Eds.). Readings on modernity in Africa. Indiana University Press, 2008. p. 214-220. Disponível em: http://www.newschool.edu/ uploadedFiles/Faculty/NSSR/Roitman - A Successful Life.pdf. Acesso em: 12 nov. 2018.
SANTOS, Fabrizio Cândia dos. Liberdades fundamentais e regionalização: reificação das relações de trabalho nos processos de integração econômica. 2014. Dissertação (Mestrado em Sociedade, Cultura e Fronteiras) - Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Foz do Iguaçu, 2014.
SILVA, Regina Coeli M. e, GODOY, Marisa Elizabete C. “Tomar cuidado com o que falo”: ser criança na escola, ficar e brincar em casa. Revista Latitude, Universidade Federal de Alagoas, v. 10, n.2, 2016.
SILVA, Regina Coeli Machado e. O Estado-Nação se (des)fazendo no cotidiano vivido em uma escola de fronteira Brasil, Argentina e Paraguai. Disponível em: http://www.enadir 2015.sinteseeventos.com.br/simposio/view?ID_SIMPOSIO=17. Acesso em: fev. 2015.
_____.Vidas, Nações e Estados se fazendo nas fronteiras entre Brasil, Paraguai, Argentina. Revista Ideação do Centro de Educação Letras e Saúde da UNIOESTE. Campus de Foz do Iguaçu. v. 15, n. 2, p. 10-32, 2º sem. 2013.
SIMMEL, Georg. “El secreto y la sociedad secreta”. In: _____. Sociologia 1 Estudios sobre las formas de socialización. Madrid: Alianza Editorial, 1986.
TAUSSIG, Michael. Defacement: public secrecy and the labor of the negative. Califórnia: Stanford, 1999.
TELLES, Vera da Silva. As cidades nas fronteiras do legal e ilegal. Belo Horizonte: Argumentum, 2010 a.
_____. Nas dobras do legal e ilegal: ilegalismos e jogos de poder nas tramas da cidade. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 2, n. 5-6, p. 97-126, jul.-ago.-set.-out.-nov.-dez. 2010.
WEBER, Max. Economia e sociedade. 3 ed. Brasília: Editora da UnB, 1994. v. 1. cap. 8.
_____. O Direito na economia e na sociedade. São Paulo: Ícone Editora, 2013.
ZEMPLÉNI, A. Secret et sujétion: pourquoi ses "informateurs” parlent à l’ethnologue. Traverses. v.30-31, p. 102-115, 1984.
WEISS, Fernando L. “O sentido e a abrangência do sigilo fiscal”. Revista Dialética de Direito Tributário (RDDT), São Paulo, n. 178, 2010.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Os autores concedem à revista Ambivalências todos os direitos autorais referentes aos trabalhos publicados. Os conceitos emitidos em artigos assinados são de absoluta e exclusiva responsabilidade de seus autores.