Chamada para Dossiê Temático “Streaming e as mudanças nos mercados e nos conteúdos do audiovisual contemporâneo”
Serviços de audiovisual distribuídos pela Internet vêm ganhando visibilidade, fatias de mercado e destaque entre produções premiadas na última década. As mudanças inicialmente observadas no áudio chegaram ao vídeo nos últimos anos, o que motivou alguns atores do setor de mídia a chamar o cenário atual de “guerra do streaming”. Esse novo contexto coloca desafios de diferentes ordens, tanto do ponto de vista econômico como cultural e regulatório.
Para ampliar a discussão sobre o tema, a Revista EPTIC publicará, em sua terceira edição de 2022, o Dossiê Temático “Streaming e as mudanças nos mercados e nos conteúdos do audiovisual contemporâneo”, que será coordenado por Marcelo Kischinhevsky, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Ezequiel Alexander Rivero, da Universidad de Buenos Aires (UBA). Os artigos podem ser enviados até o dia 01 de julho. A publicação está prevista para outubro de 2022.
O áudio foi o setor pioneiro, constituindo um laboratório de inovação para a indústria diante da digitalização da comunicação e da cultura e, mais recentemente, com o crescimento acelerado de plataformas de streaming como Spotify, Apple Podcasts, Amazon Music, Google Podcasts, Deezer, iHeartRadio, entre outras, e com a multiplicidade da oferta (Brittos, 2002) de conteúdos sob demanda, especialmente no caso do podcasting. A ascensão do áudio por streaming impactou sobremaneira os modelos de negócio da indústria fonográfica e do rádio, gerando consequências sobre as estruturas de mercado e sobre o próprio processo criativo e produtivo de músicas e álbuns. Kischinhevsky et al. (2021) mostram como os modelos de seleção musical do streaming calcados em algoritmos e sistemas automatizados também tensionam as rádios.
No setor de vídeo por streaming, em um primeiro momento no início dos anos 2010, alguns pioneiros, como Netflix, passaram a ganhar pequenas fatias de mercado. Ao longo dos anos, passaram a ameaçar a TV por assinatura. Grandes programadoras se viram no “dilema do inventor”: manter suas receitas junto a operadoras de TV paga ou migrar para a oferta direta de serviços de streaming. Nos últimos dois anos, esses atores consolidaram a atuação nas duas frentes, com lançamento de serviços como HBOMax, Disney+ e Discovery+.
A esse cenário, soma-se a entrada das grandes plataformas digitais com serviços tanto de áudio quanto de vídeo. Esses agentes aproveitaram seu papel central de grandes mediadores do acesso a conteúdos online para lançar seus serviços, como AppleTV e Apple Music, YouTube Premium e YouTube Music, PrimeVideo e PrimeMusic e Facebook Watch. As grandes plataformas digitais promovem uma verticalização no mercado promovendo novas barreiras à entrada e colocando desafios.
Esses agentes localizam-se, em sua absoluta maioria, no Norte Global. Assim, a emergência e a guerra do streaming implicam também novos modos de fortalecimento do poder cultural dessas nações sobre os países do Sul Global e da periferia capitalista. O fortalecimento desses serviços coloca, portanto, um desafio ainda maior para os debates das culturas nacional, regional, popular e alternativa.
Esse cenário aponta complexidades para uma análise acurada e crítica. Do ponto de vista econômico, um primeiro desafio é a compreensão das transformações nos mercados e mapeamento das novas estruturas de mercado e barreiras à entrada. A Economia Política da Comunicação oferece ferramentais analíticos importantes para esse esforço, que podem contribuir para um olhar integrado e dialético sobre as mudanças nos segmentos em relação à evolução dos mercados do macrossetor das comunicações e dos determinantes gerais do sistema.
Do ponto de vista cultural, os serviços de streaming lineares e sob demanda são tensionados por uma dinâmica adaptação-inovação tanto entre os novos meios em relação aos antigos (sobretudo o rádio, a TV e o cinema) quanto sobre os formatos e gêneros desenvolvidos nas mídias que lideraram os mercados ao longo do século XX e início do século XXI. A EPC também oferece instrumentos de avaliação crítica para compreender tais implicações sob a perspectiva da relação com as mudanças econômicas do próprio setor e das transformações do conjunto da sociedade.
A presente chamada do dossiê convida os pesquisadores a apresentar reflexões sobre essas problemáticas. Detalhamos a seguir temas de interesse para as propostas de artigo:
- A evolução do áudio e do vídeo em streaming sob a perspectiva da EPC;
- As transformações e a concorrência nos mercados de áudio e vídeo em streaming;
- Os impactos das alterações do áudio e vídeo em streaming sobre os mercados audiovisuais;
- A plataformização do áudio e vídeo e seus impactos econômicos e políticos;
- Os problemas decorrentes da hegemonia cultural dos países do Norte Global a partir dos serviços de streaming e os desafios à soberania nacional e regional;
- Os desafios e debates regulatórios sobre áudio e vídeo em streaming;
- Os conteúdos de áudios e vídeo em streaming sob a ótica da EPC;
- A presença e o papel das plataformas nacionais de áudio e vídeo (públicas ou privadas), atores periféricos do streaming no marco de uma disputa geopolítica centrada no Norte
- Diversidade e pluralidade de vozes no streaming de áudio e vídeo, diante dos processos de consolidação e plataformização