SABORES E PRÁTICAS CULINÁRIAS DAS COZINHEIRAS NEGRAS DO SERIDÓ (RN – BRASIL) (SABORES Y PRÁCTICAS CULINARIAS DE LAS COCINERAS NEGRAS DEL SERIDÓ (RN – BRASIL))

Autores

  • Julie Antoinette Cavignac
  • Danycelle Silva

DOI:

https://doi.org/10.33360/RGN.2318-2695.2019.i2especial.p.20-40

Resumo

RESUMO:

A região do Seridó é marcada por seu passado colonial, em particular pelos ciclos econômicos do gado e do algodão. A memória da escravidão ficou silenciada aos longos dos anos e só recentemente ressurge, lançando novas luzes sobre um passado de sombras e silêncios. A retomada das memórias e a emergência étnica apoiam-se nos sabores e nas práticas culinárias tradicionais que substituem os silêncios e possibilitam recontar uma outra história. Através de pesquisas realizadas junto a atividades do Projeto de Pesquisa e Extensão Tronco, Ramos e Raízes, coletamos dados etnográficos em diversas localidades do Seridó, seguindo os rastros das memórias das cozinheiras negras. Nas cozinhas do Seridó, emerge um patrimônio cultural de matriz africana que estava invisibilizado mas, no entanto, presentes no cotidiano: conforme apontamos ao longo do artigo, as comidas “do tempo do cativeiro” ainda são a base da alimentação cotidiana na atualidade e são pouco a pouco revalorizadas. Práticas e técnicas alimentares transmitidas pelas mulheres no seio das famílias negras ao longo das gerações: essas comidas de raízes ultrapassam hoje o âmbito doméstico e entra para o gosto público, como patrimônio.

Palavras-chave: Saberes. Alimentação. Patrimônio Cultural. Memórias.

 

RESUMEN:

La región del Seridó tiene en sus huellas la fuerte presencia de su pasado colonial, en particular por los ciclos económicos del ganado y del algodón. La memoria de la esclavitud se quedó silenciada a lo largo de los años y sólo recientemente resurge, lanzando nuevas luces sobre un pasado de sombras y silencios. La retomada de las memorias y la emergencia étnica se apoyan en los sabores y en las prácticas culinarias tradicionales que sustituyen a los silencios y posibilitan el recuerdo de otra historia. A través de investigaciones realizadas junto a actividades del Proyecto de Investigación y Extensión Tronco, Ramos y Raíces, recogemos datos etnográficos en diversas localidades del Seridó, siguiendo los rastros de las memorias de las cocineras negras. En las cocinas del Seridó, emerge un patrimonio cultural de matriz africana que estaba invisible pero, sin embargo, presentes en el cotidiano: como señalamos a lo largo del artículo, las comidas “del tiempo del cautiverio” todavía son la base de la alimentación cotidiana en la actualidad y son poco a poco revalorizadas. Prácticas y técnicas alimentares transmitidas por las mujeres en el seno de las familias negras a lo largo de las generaciones: esas comidas de raíces sobrepasan hoy el ámbito doméstico y entra al gusto público, como patrimonio.

Palabras clave: Saberes. Alimentación. Patrimonio cultural. Memorias.

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Publicado

2019-10-01