SÍLVIO ROMERO E O NASCIMENTO (MODERNO) DO ENSINO DE FILOSOFIA NO BRASIL
Ricardo Henrique Resende de Andrade
Resumo
A filosofia é ensinada no Brasil desde o século XVI pelos Jesuítas, mas foi apenas em 1885 que o pensador sergipano Sílvio Romero lavrou a sua certidão de nascimento moderna num opúsculo (A filosofia e o ensino secundário) escrito a guisa de proposta para reforma do ensino da filosofia no Colégio Pedro II. Seu projeto consistia em substituir o currículo do ensino de filosofia composto por 6 disciplinas (ontologia, psicologia, lógica, teodiceia, moral e história da filosofia) por um programa mais exíguo, apenas com lógica dedutiva e lógica indutiva. Não há dúvidas que Romero foi um destacado professor e divulgador da filosofia no Brasil, mas poucas vezes foi considerado um filósofo pelos seus pares e ao que nos parece jamais aspirou a sê-lo. Considerava-se um crítico, não apenas da literatura, mas da cultura brasileira. Foi um autodidata que abriu discussões profundas em diversos campos do conhecimento em nosso País. Descontados alguns pressupostos de sua posição filosófica (hoje bem menos influentes) e a picardia do seu estilo beligerante, resta ao documento o valor de provocar uma reflexão em torno de questões que ainda repercutiriam por décadas entre os que o sucederam na tarefa de pensar o ensino da filosofia no Brasil. O objetivo desta comunicação é apresentar a argumentação romeriana em torno dos defeitos gerais do plano de ensino em vigência e as razões para modifica-lo, evidenciando os aspectos que fazem das questões levantadas no opúsculo temas de interesse sempre renovado entre os pesquisadores da área. A “natureza da filosofia”, problemas políticos da época, o papel do ensino secundário, as particularidades da instituição na qual atuava, compõem o repertório das alegações aduzidas em favor da reforma que não se concretizou. Contudo, a sua compreensão sobre o perfil psicológico e cultural dos jovens estudantes das elites brasileiras e o seu modo particular de assimilar o pensamento europeu do seu tempo (do positivismo ao evolucionismo, passando pelo criticismo kantiano e tantas outras “novidades intelectuais” que o fascinavam) são os fatores que melhor explicam o caráter moderno e pragmático de sua propositura. Sendo um espírito ativo, de labor incansável e um apaixonado pelas coisas do Brasil, aplicou sua operosidade multiforme à história, à etnografia, à sociologia, à filosofia, ao direito, à poesia e à crítica literária. Em tudo se dedicou com afinco, tendo em mente seu projeto para o futuro do País. Sua recomendação de ensinar o raciocínio lógico e à argumentação ao invés das embaraçosas querelas metafísicas tinha como pano de fundo sua expectativa quanto a adesão nacional às transformações ocorridas entras as nações mais desenvolvidas em termos econômicos e tecnológicos no final do século XIX. Atualmente a presença da filosofia no currículo secundário também é questionada quase nos mesmos termos, considerando-se a pressão para adequar os sistemas de ensino às demandas por desenvolvimento tecnológico e econômico no mundo contemporâneo. Talvez por isso a reflexão deste crítico intrépido possa nos ajudar a entender qual poderá ser o papel da filosofia na educação básica diante dos atuais desafios.