ESCRAVIDÃO, SOCIEDADE E TEOLOGIA NATURAL EM MARIA FIRMINA DOS REIS
Resumo
A compreensão de Maria Firmina dos Reis (1825-1917) sobre a escravidão revela-se em sua escrita literária, sobretudo ao lamentar a realidade opressora que o escravizado vivencia, o qual, estando em terras estranhas perde o contato com a beleza e a tranquilidade da paisagem do seu ambiente familiar: “Fogem-lhe os areais ardentes, as sombras projetadas pelas árvores, o oásis no deserto, a fonte e a tamareira – foge a tranquilidade da choupana, foge a doce ilusão de um momento como ilha movediça, porque a alma está encerrada nas prisões do corpo”. (Úrsula, cap. 2). Como ocorre na tradição cristã, também para Maria Firmina a alma humana é a imagem e semelhança do divino. Além disso, pertence ao arbítrio da alma o exercício da contemplação do divino mediante a realidade natural: “O campo, o mar, a abóbada celeste ensinam a adorar o supremo Autor da natureza, e a bendizer-lhe a mão, porque é generosa, sábia e previdente. Eu amo a solidão; porque a voz do Senhor aí impera; porque aí despe-se-nos o coração do orgulho da sociedade, que o embota, que o apodrece, e livre dessa vergonhosa cadeia, volve a Deus e o busca – e o encontra, porque com o dom da ubiquidade Ele aí está!”. (Úrsula, cap. 1). Maria Firmina, portanto, reporta-se à importância do calar-se, do silêncio para que aconteça uma conexão com o divino. Em alguma medida, ao que parece, o vínculo mental com o divino, em princípio, levaria o ser humano a restaurar-se antes de todo convívio social. Aqui aparece o sentido de sociedade corrompida, conforme Maria Firmina, quer dizer, grupos sociais que não vivem autenticamente a conexão com o divino e que, por conseguinte, corrompem o indivíduo e o coletivo. São grupos sociais cujos indivíduos componentes não vivem o verdadeiro silêncio, a verdadeira contemplação, a verdadeira escuta do “eu” que é simultaneamente divino e humano. Nesse sentido, o objetivo desta comunicação é apresentar a relação entres os conceitos de escravidão, sociedade e divindade estabelecida por Maria Firmina no romance Úrsula. Para tanto, também analisaremos o modelo de sociedade de Maria Firmina baseado primordialmente no desenvolvimento individual da autoconsciência sobre o que é a dignidade humana, que no limite coincide com a dignidade divina. Em suma, evidenciaremos que, no romance Úrsula, Maria Firmina propõe uma noção de restauração social cujo início é a abolição da escravatura, o que não ocorreria se os indivíduos não removessem de seus corações a couraça do orgulho.
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1. Proposta de Política para Periódicos de Acesso Livre
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