Apresentação - nº 27

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DOI:

https://doi.org/10.51951/ti.v12i27.p4-6

Resumo

JORGE DE LIMA NO CONTEXTO DA
LITERATURA MODERNISTA BRASILEIRA

 

APRESENTAÇÃO

 

            Mais de cem anos da estreia de Jorge de Lima na literatura, sua obra firmou-se como uma das mais contundentes da lírica brasileira. Tendo surgido em meio à fase heroica do nosso Modernismo, o poeta teve participação expressiva na poesia mística que caracterizou um dos vieses da segunda geração, unindo o sincretismo religioso de ordem cristã a uma reflexão sobre a criação poética, aproximando metalinguagem e metafísica, poesia e sagração. Ao encontrar as realidades históricas na totalidade universal, transitou pelos contextos regionais em busca do ritmo e da sabedoria cósmica, unindo localismo e universalismo de modo ímpar na poesia brasileira. Não esteve à margem das vanguardas; comumente associado ao movimento surrealista, engendrou uma obra imagética, com metáforas insólitas, plasticizada por ritmos ora próximos da tradição, ora aparentemente fluidos, de uma espontaneidade que camufla seu trabalho de elaboração. Entrecruzando a mítica e a mística, o poeta dialoga aspectos caros do passado mais remoto com atmosferas poéticas e temas próprios do século XX, como a guerra, os governos totalitários, as mais variadas formas de opressão e o contexto político e social brasileiro.

            O texto de chamada deste dossiê propôs “compor um panorama crítico do escritor, acolhendo artigos que apresentem estudos interpretativos e analíticos de sua obra”, o que consideramos de extremo valor, tanto pela necessidade de reconhecimento e de estudos  acerca de sua obra em particular quanto pelos modos com que sua produção reverbera na contemporaneidade. Composta de oito artigos, uma entrevista e uma carta inédita, a edição contempla tais propósitos, com leituras críticas de obras e de conjuntos de obras, entre poesia, prosa e fotomontagens.

            Abrindo a edição, Suene Honorato faz uma leitura das epígrafes de Jorge de Lima no livro Invenção de Orfeu, lidas em conjunto e em relação com a obra, em artigo intitulado “As epígrafes de Invenção de Orfeu”. A mesma obra é referendada no texto seguinte, de Sérgio Carvalho de Assunção, que a compreende “Entre delírios e vertigens: imersões extemporâneas na ilha de Orfeu”; o autor reúne elementos vários da obra, num amálgama que dispensa a leitura rígida, tentando capturar modos e formas de organização da ilha movediça criada por Jorge de Lima.

            Em “A infância das vanguardas e ‘O mundo do menino impossível’, do folheto ao livro”, Vagner Camilo detém-se sobre o poema de 1927, compreendido na perspectiva do poeta adulto transfigurado no entretenimento infantil, propondo leituras críticas do poema isolado, mas também “como parte de uma unidade maior”. Rafael Iatzak Rigoni, por seu turno, parte da imagem da torre em dois sonetos do Livro de Sonetos (1949) para explorar tensões que, ao contrário de recusarem o real e a comunicação, estruturam sua “negatividade”; trata-se de “Uma torre de guerra: análise da imagem da torre de marfim em dois sonetos de Jorge de Lima”. O artigo “A eterna chama e a melodia infinita: leitura de um soneto de Jorge de Lima” também faz leitura crítica de um soneto de Livro de Sonetos; Fabrício Carlos Clemente e Luana Uchôa Torres leem o poema “Essa pavana é para uma defunta” em sua relação de afirmação e transgressão do modelo clássico, tendo como aspecto central a relação entre poesia e música.

            Os três artigos seguintes se dedicam a outras abordagens da obra limiana, para além do estudo da poesia. Gabriela Martins Ribeiro Neta, em “Jorge de Lima e o jogo imagético entre as fotomontagens e a poesia”, debruça-se sobre as fotomontagens de A pintura em pânico e o poema Invenção de Orfeu, com vistas a explorar aspectos como o insólito, o sonho e o surrealismo. O romance O anjo (1934) é objeto de estudo do próximo artigo; em “O Herói melancólico em O anjo, de Jorge de Lima”, José Antonio Santos de Oliveira dá ênfase à “construção melancólica da personagem Herói”, entrevista pelo seu arrefecimento diante do avanço tecnológico do mundo. Fechando a seção de artigos, Samara Inácio da Silva e Manoel Freire Rodrigues trafegam pela ficção romanesca de Jorge, de modo mais geral, observando suas relações com o Modernismo da fase heroica e o modernismo regionalista de 1930, no texto que se intitula “O experimentalismo estético no romance de Jorge de Lima: do legado da geração de 22 ao romance de 30”.

            Num segundo momento deste dossiê, apresentamos uma entrevista com Fábio de Souza Andrade – expoente da crítica contemporânea limiana. Andrade organizou antologias crítica da obra poética de Jorge, além de edições, posfácios e aparatos críticos a seu poema maior, Invenção de Orfeu. Na entrevista, realizada por Alexandre de Melo Andrade e Solange Fiuza Cardoso Yokozawa, o crítico fala sobre questões caras da obra e da crítica em torno do escritor, como a relação entre o misticismo e a abordagem social, as fases de sua produção, sua atualidade, os modos de composição da Invenção de Orfeu, a vertente órfica do catolicismo, o olhar da crítica mais contemporânea e a relação instituída entre sua obra e os leitores.

            Encerrando a edição, constamos uma carta de Jorge de Lima para Adolfo Casais Monteiro, datada de 1936, com texto de apresentação de Arnaldo Saraiva. O crítico português tece comentários acerca das relações de Jorge de Lima com os poetas portugueses e trata de algumas questões que marcam o diálogo, que era frequente, entre os dois escritores. A carta foi publicada no n. 50 de julho de 1979 na Revista Colóquio/Letras, de Lisboa, cabendo à Travessias Interativas publicá-la pela primeira vez no Brasil.

            Não nos é possível concluir esta apresentação sem fazer os justos agradecimentos: 1) aos autores dos artigos, que certamente estão contribuindo consideravelmente para a fortuna crítica de Jorge de Lima, com novos olhares sobre sua obra; 2) a Fábio de Souza Andrade, pela disponibilidade e gentileza em nos confiar a entrevista, tão enriquecedora; 3) a Arnaldo Saraiva, que nos cedeu a republicação da carta inédita no Brasil de Jorge de Lima para Adolfo Casais Monteiro, complementada pelo seu texto de apresentação; 4) ao conselho editorial e aos pareceristas ad hoc, que nos auxiliaram na leitura crítica dos textos. É gratificante, para a equipe da Travessias e para nós, organizadores do dossiê, perceber o volume de informações e análises críticas que ora disponibilizamos, tendo a certeza de que a obra de Jorge de Lima merece todas essas leituras.

 

Alexandre de Melo Andrade
Solange Fiuza Cardoso Yokoawa
Organizadores

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Publicado

30-01-2023

Como Citar

ANDRADE, Alexandre de Melo; YOKOZAWA, Solange Fiuza Cardoso. Apresentação - nº 27. Travessias Interativas, São Cristóvão-SE, v. 12, n. 27, p. 4–6, 2023. DOI: 10.51951/ti.v12i27.p4-6. Disponível em: https://periodicos.ufs.br/Travessias/article/view/18657. Acesso em: 19 dez. 2024.