A psiquiatrização da vida cotidiana e a construção de neuroidentidades virtuais

Autores

DOI:

https://doi.org/10.21669/tomo.v44.21851

Palavras-chave:

Redes Sociais, Autodiagnóstico, Saúde mental, Identidade, Medicalização

Resumo

O artigo examina a influência das redes sociais na saúde mental, destacando como plataformas como o Instagram e o YouTube contribuem para o aumento dos autodiagnósticos psiquiátricos, especialmente entre os jovens. Esse fenômeno se intensificou durante a pandemia de Covid-19, quando informações sobre saúde mental se espalharam amplamente, levando muitos a buscarem autodiagnósticos e a se identificarem com neuroidentidades virtuais, usando expressões como "sou autista", "sou TDAH" ou “tenho depressão”. A depressão, o autismo e o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) são definidos no discurso médico-psiquiátrico como condições que impactam significativamente a vida dos indivíduos. A depressão é descrita como uma doença psiquiátrica que altera o humor, provocando tristeza profunda, desesperança, baixa autoestima, distúrbios do sono e do apetite (Ministério da Saúde, 2024a). O autismo, ou Transtorno do Espectro Autista (TEA), é um transtorno do desenvolvimento neurológico que compromete a comunicação, a socialização e resulta em comportamentos repetitivos (Ministério da Saúde, 2024b). Já o TDAH é definido como um transtorno neurobiológico, de origem genética, caracterizado por desatenção, inquietação e impulsividade, podendo persistir ao longo da vida (Ministério da Saúde, 2024c). Esse processo reflete uma psiquiatrização da subjetividade e está profundamente conectado à lógica neoliberal de transformar identidades em mercadorias. As redes sociais amplificam esse movimento ao oferecerem um espaço de apoio, mas também simplificam questões complexas de saúde mental, muitas vezes reduzindo a compreensão do sofrimento psicológico a diagnósticos e rótulos psiquiátricos.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Javier Marzal, Centro Universitario UNICESUSC

Doutor em Ciências Humanas pela Universidade Federal de Santa Catarina (2023). Psicanalista membro do Laço Analítico-Escola de Psicanálise. Realiza Estágio Pós-doutoral no Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas da Universidade Federal de Santa Catarina. Professor do Curso de Psicologia do Centro Universitário UNICESUSC (2023). Pesquisador do Núcleo de estudos em sociologia, filosofia e história das ciências da saúde (NESFHIS/UFSC). Pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Profissões e Instituições (NEPPI/UFSC). Membro da Rede Iberoamericana de História da Psiquiatria - RIHP. Possui Pós-Graduação (Especialização) em Psicologia e Saúde Mental - Faculdade Metropolitana do Estado de São Paulo (2019). Psicanalista. Possui Graduação em Psicologia - Universidade de Oriente (2011). Professor Instrutor - Universidade de Oriente, Cuba (2011-2015). Tem experiência na área da Psicologia Clínica e da Saúde Mental.

Sandra Caponi, Universidade Federal de Santa Catarina

Professora Titular do Departamento de Sociologia e Ciência Política da da Universidade Federal de Santa Catarina. Possui graduação em Filosofia - Universidad Nacional de Rosário (Argentina), mestrado em Lógica e Filosofia da Ciência pela UNICAMP, doutorado em Lógica e Filosofia da Ciência pela UNICAMP, realizou um primeiro Pós-doutorado na Universidade de Picardie (França) em 2000, e um Pós-doutorado Sênior na EHESS (Paris- França) em 2011 . Atualmente é coordenadora do Projeto Capes- Cofecub, convenio com Paris VIII, denominado "A disseminação dos saberes expertos no domínio da Infância" e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Bioética- Regional Santa Catarina (SBB-SC). Consultora ad hoc de diversas publicações científicas. No ano 2017 realizou um Estágio Sênior de seis meses na Universidad de Buenos Aires, Argentina (UBA) e seis meses na Université Paris Diderot, França (Paris VII). É bolsista de produtividade em pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico nível 1D. Atuou como professora visitante na EHESS (Paris- França), no College de France (Paris), na Universidad Nacional de Colombia (Medellín); na Universidad Nacional de Rosario (Argentina). Desenvolve seu trabalho na área de epistemologia e história da psiquiatria, da medicina e na área de Bioética. É professora permanente do Doutorado Interdisciplinar em Ciências Humanas da UFSC e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da mesma Instituição. Coordena o grupo de pesquisa cadastrado no CNPq, "Sociologia, Filosofia e história das ciências da saúde". Conta com diversas teses de doutorado e dissertações de mestrado orientadas e defendidas. No ano de 2013 o livro "Loucos e Degenerados: uma genealogia da psiquiatria ampliada" foi finalista do 55 Prêmio Jabuti na área de Psicologia e Psicanálise. Foi contemplada com um Grant Maria Zambraano, da Uniao Europeia, para desenvolver atividades de pesquisa no MARC/ Dasfits da Universidade Rovira e Virgili. Espanha. PRÊMIO PROPESQ- UFSC 2023 Mulheres na Ciência 3. Edição. Categoria Senior (Área do Conhecimento Humanidades).

Referências

ARENDT, Hannah. A condição humana. Barcelona: Paidós, 2005.

AUTISTICTHRIFTER. About Me. 2024. Disponível em: https://rockcontent.com/br/blog/wordpress-com-ou-wordpress-org/. Acesso em: 14 set. 2024.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

CABANAS, Edgar; ILLOUZ, Eva. Happycracia: fabricando cidadãos felizes. São Paulo: Ubu Editora, 2022.

CAPONI, Sandra. O DSM-V como dispositivo de segurança. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 24, p. 741-763, 2014. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-73312014000300005

CETIC.BR. TIC Kids Online Brasil 2021. Disponível em: https://cetic.br/pt/pesquisa/kids-online/indicadores/. Acesso em: 23 jul. 2024.

CORBANEZI, Elton Rogério. *Saúde mental, depressão e capitalismo*. São Paulo: Editora Unesp, 2021.

DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo. São Paulo: Boitempo Editorial, 2017.

DAVIES, James. Sedated: How modern capitalism created our mental health crisis. London: Atlantic Books, 2021.

ERIKSON, Erik H. Identidade. Juventude e crise. Editora Guanabara. Rio de Janeiro 2ª Edição, 1987.

GUIZZO, Daniele Cristina; INVERNIZZI, Noela. A Potencialização das Práticas Biopolíticas pela Tecnologia: Novas Produções do Corpo e Gênero Feminino. Revista Ártemis, v. 13, n. 1, 2012. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/artemis/article/view/14218. Acesso em: 23 jul. 2024.

JOHNSTONE, Lucy e CROMBY, John (2024) Neurodiversidade: Somos todos neurodivergentes hoje?. Mad in México. 28 de agosto. Disponivel em: Neurodiversidad: ¿Somos todos neurodivergentes hoy en día? (Parte 2) - Mad in Mexico

KHALAF, A. M.; ALUBIED, A. A.; KHALAF, A. M.; RIFAEY, A. A. The Impact of Social Media on the Mental Health of Adolescents and Young Adults: A Systematic Review. Cureus, v. 15, n. 8, p. e42990, 2023. Disponível em: https://doi.org/10.7759/cureus.42990. Acesso em: 16 set. 2024. DOI: https://doi.org/10.7759/cureus.42990

LENHART, Amanda. Teens, Social Media & Technology Overview 2015. Pew Research Center, 2015. Disponível em: https://www.pewresearch.org/internet/2015/04/09/teens-social-media-technology-2015/. Acesso em: 23 jul. 2024.

LOUISA, Ashra. Echolalia is the repetition of things you have heard/read, or can also be repetition of sounds or internal counting. 2024a. Instagram @ashralouisa. Disponível em: https://www.instagram.com/p/C-sm16TRBVD/. Acesso em: 14 set. 2024.

LOUISA, Ashra. These are some examples of things my brain thinks about consciously or subconsciously as a high masking autistic prior to social interaction. 2024b. Instagram @ashralouisa. Disponível em: https://www.instagram.com/p/C-DY5maxZMV/. Acesso em: 14 set. 2024.

LOUISA, Ashra. Just some lil things I do as an autist. 2024c. Instagram @ashralouisa. Disponível em: https://www.instagram.com/p/C8926jxxm1C/. Acesso em: 14 set. 2024.

LOUISA, Ashra. One of my biggest life passions growing up autistic has been trying to understand how humans work, both my own brain and others. 2024d. Instagram @ashralouisa. Disponível em: https://www.instagram.com/p/C-xwZ8nR8g4/. Acesso em: 14 set. 2024.

MARTINEZ HERNÁEZ, Angel. “El secreto está en mi interior”. La neuropolítica y la emergencia de las neuronarrativas en el consumo de antidepressivos. In: COMELLES, Josep (Org.). Educación, comunicación y salud. Tarragona: Universitat Rovira i Virgili, 2017.

MURPHY, Samanta. Adolescentes usam redes sociais para se diagnosticarem com TDAH, autismo e outros distúrbios. CNN Brasil, 2023. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/saude/adolescentes-usam-redes-sociais-para-se-diagnosticarem-com-tdah-autismo-e-outros-disturbios/. Acesso em: 16 set. 2024.

NICHOLAS, J.; LARSEN, M. E.; PROUDFOOT, J.; CHRISTENSEN, H. Mobile apps for bipolar disorder: a systematic review of features and content quality. Journal of Medical Internet Research, v. 19, n. 4, p. e133, 2017.

NUNES, Bruno. Você já teve esse sentimento de culpa por não conseguir executar o que precisava?. 2024a. Instagram @brunolimanunes. Disponível em: https://www.instagram.com/p/C_2v1CcqFbS/. Acesso em: 14 set. 2024.

NUNES, Bruno. Como foi feito o seu diagnóstico de TDAH?. 2024b. Instagram @brunolimanunes. Disponível em: https://www.instagram.com/p/C_nUX_EhrYQ/. Acesso em: 14 set. 2024.

NUNES, Bruno. Você já notou esse tipo de desregulação emocional em você? Qual foi a situação?. 2024c. Instagram @brunolimanunes. Disponível em: https://www.instagram.com/p/C_X2RoEJLps/. Acesso em: 14 set. 2024.

PENAS, Esther. Entrevista: Lola López Mondéjar. Ctxt, 1 set. 2020. Disponível em: https://ctxt.es/es/20200901/Culturas/33345/Esther-Penas-entrevista-Lola-Lopez-mondejar-identidad-capitalismo-felicidad-ansiedad-sexualidad--poliamor.htm. Acesso em: 16 set. 2024.

PSYCH2GO PORTUGUÊS. 6 Sinais De Que Você Sofre Depressão (E Não Preguiça). 2023. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=oWUKFv3nwoY. Acesso em: 16 set. 2024.

ROSE, Nikolas. Our psychiatric future: The Politics of Mental Health. Cambridge: Polity Press, 2019.

RYAN, A.; WILSON, S. Internet healthcare: do self-diagnosis sites do more harm than good? Expert Opinion on Drug Safety, v. 7, n. 3, p. 227-229, 2008. Disponível em: https://doi.org/10.1517/14740338.7.3.227. Acesso em: 8 jul. 2024. DOI: https://doi.org/10.1517/14740338.7.3.227

STATISTA. Distribution of Instagram users worldwide as of April 2023, by age and gender. Disponível em: https://www.statista.com/statistics/325587/instagram-global-age-group/. Acesso em: 23 jul. 2024.

TOROUS, J.; FRIEDMAN, R.; KESHAVAN, M. Smartphone ownership and interest in mobile applications to monitor symptoms of mental health conditions. JMIR mHealth and uHealth, v. 2, n. 1, p. e2, 2014. DOI: https://doi.org/10.2196/mhealth.2994

TANG, H.; NG, J. H. Googling for a diagnosis—use of Google as a diagnostic aid: internet based study. BMJ, v. 333, n. 7579, p. 1143-1145, 2006. DOI: https://doi.org/10.1136/bmj.39003.640567.AE

WESTERLUND, M.; HADLACZKY, G.; WASSERMAN, D. Case study of posts before and after a suicide on a Swedish Internet forum. British Journal of Psychiatry, v. 207, n. 5, p. 476-482, 2015. Disponível em: https://www.cambridge.org/core/journals/the-british-journal-of-psychiatry/article/case-study-of-posts-before-and-after-a-suicide-on-a-swedish-internet-forum/4765DAF126B4F9F232DA46381BD9F24A. Acesso em: 23 jul. 2024. DOI: https://doi.org/10.1192/bjp.bp.114.154484

Publicado

2025-01-03

Como Citar

Marzal, J., & Caponi, S. (2025). A psiquiatrização da vida cotidiana e a construção de neuroidentidades virtuais . Revista TOMO, 44, e21851. https://doi.org/10.21669/tomo.v44.21851

Edição

Seção

Dossiê: Tecnologias digitais e bem-estar: o olhar da Sociologia dos Mercados

Categorias